Foto do(a) blog

De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

Marão faz aos 51 com longa 'nos finalmentes'

PUBLICIDADE

Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
Marão faz aniversário nesta segunda e finaliza seu primeiro longa "Bizarros Peixes das Fossas Abissais"  Foto: Estadão

RODRIGO FONSECA É aniversário do Marão nesta seguda-feira. São 51 anos de vida a serem cevados a vodka pelo cineasta mundialmente conhecido na indústria da animação como "O Walt Disney de Nilópolis". O aniversário coincide com a finalização do último dos 40 mil desenhos que compõem o primeiro longa-metragem de uma carreira de 14 filmes (exibidos em 632 festivais), coroada com 120 prêmios planeta afora. Depois de resistir a um esboço de AVC, decorrente de stress combinado com má alimentação e falta de atividade física, o diretor, egresso da Escola de Belas Artes da UFRJ, termina, enfim, "Bizarros Peixes das Fossas Abissais". Neste domingo, ele vai ser homenageado no Estação NET Rio, onde fará uma masterclass sobre sua estética. Na entrevista a seguir, o realizador de "Até a China" (2015) comenta sobre o futuro do projeto, que tem um elenco de vozes invejável. Natália Lage é a protagonista. Guilherme Briggs cede o gogó a uma nuvem com incontinência pluviométrica. E Rodrigo Santoro interpreta uma tartaruga com transtorno obsessivo compulsivo.

Heroína do filme tem a voz de Natália Lage Foto: Estadão

Quanto falta para a finalização de "Bizarros Peixes das Fossas Abissais" e o que você planeja para seu longa de estreia? Marão: Estamos nos finalmentes... finalmente. Foram quarenta mil desenhos até agora para a animação, eu que dividi com Rosaria e Fernando Miller. Temos 70 minutos finalizados. Agora, só falta UM. Isso significa que faltam menos de mil desenhos. Só mais mil. Além de cuidar da produção, Letícia Friedrich também é sócia da Boulevard, a distribuidora do longa. Ressalto como ela mudou toda a minha vida profissional desde que começamos a trabalhar juntos. A compreensão da produtora Letícia de que este é um filme esquisito - bizarro como o título - e sua dedicação em construir uma dinâmica específica pra nossas idiossincrasias, e vez de tentar emular a logística de qualquer outra produção de animação, fez toda a diferença pro resultado deste trabalho. Fez diferença para termos um cotidiano feliz e de afeto dentro da equipe por todos esses anos.Como foi o teu trabalho com teu elenco de vozes? Marão: As falas foram gravadas há quase cinco anos. Todas precisam ser editadas em sua versão final, antes de as cenas serem animadas, porque eu preciso da decupagem do lip sync (o sincronismo labial que decupa os fonemas do diálogo) para saber qual o formato de cada boca em cada frame. Uma animação não tem som direto. Embora as falas estejam prontas, todos os sons e ruídos são criados posteriormente. E muitas vezes de forma inusitada, como o amassar de um saco de batatas fritas para simular o quebrar de ossos ou o esmagar de um pé de alface para simular um soco. Nos próximos três meses, todos estaremos (já estamos!) trabalhando simultaneamente na finalização das últimas cenas e na sonorização, trilha, edição de som e mixagem do filme, que estará pronto no segundo semestre deste ano".O que você acredita ter buscado expressar ao longo de sua carreira? Marão: "Bizarros Peixes das Fossas Abissais" é um longa esquisito de uma carreira de curtas de animação esquisitos. Mas vislumbrei toda a minha vida ali, nesses curtas. Cada fase profissional, afetiva, familiar está ali. Às vezes simbolicamente, às vezes literalmente. O trabalho de uma animadora, de um animador é, majoritariamente, numa carreira profissional, lidar com trabalhos encomendados. Comerciais, videoclipes, institucionais, séries de TV. Quando fazemos nossos curtas, é o momento da nossa voz, de falarmos sobre o que nos é mais caro e pessoal; é o momento em que vale a pena fazer todos os 40 mil desenhos. Esta semana revi meu primeiro exercício de animação de 1985, meu primeiro curta, que foi um trabalho de conclusão de curso da faculdade. E o mais importante foi ver tudo isso na Baixada Fluminense, com o público da Baixada Fluminense, num curso que ministrei no SESC, com as pessoas do lugar de onde eu sou. Nunca vi minha cidade nos desenhos animados quando eu era criança. Por isso fiz questão de exibir em primeira mão para eles as cenas do longa que acontecem em Nilópolis, com cenários da estação de trem e das ruas e lojas locais. E fiquei comovido, emocionado ao ouvir, durante a projeção, a reação das pessoas ao reconhecerem, num longa de animação, sua própria cidade, sua vila, seu cotidiano. O que senti naquele momento fez tudo valer a pena.Vamos completar três anos sem Anima Mundi. Que vácuo a ausência do festival deixou? Marão: O festival Anima Mundi foi fundamental para a animação no Brasil, desde a sua criação, em todas as facetas: para a exibição, formação de público, políticas públicas, formação profissional, organização de classe. Ele foi essencial e presente em cada etapa da correnteza da animação nacional desde 1993. Existimos hoje - com centenas de curtas por ano, cursos de graduação na área, dezenas de séries e longas em produção, reconhecimento internacional, valorização da importância cultural - graças ao Anima Mundo ter existido. Acredito sinceramente estar suspenso - por culpa deste abominável desgoverno avesso à cultura e à ciência - mas não extinto. Vai voltar. Tem que voltar. Assim como tem que voltar o Ministério da Cultura. Para a animação, esse festival tem envolvimento direto e ativo em tudo que aconteceu e acontece. Deixa um vácuo que não é só profissional ou comercial, mas criativo e afetivo. É onde nos encontramos, é o nosso Natal. Estou fazendo este longa há dez anos. Trabalho nele... trabalho em animação... por causa das sessões que vi no Anima Mundi, no início dos anos noventa. E será no Anima Mundi que exibirei nosso longa. Vai voltar.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.