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'Los Conductos': Gustavo Beck em conexão com a Berlinale

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Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
Gustavo Beck, cineasta e curador, produz "Los Conductos", ganhador do prêmio de melhor filme de estreia na Berlinale  

Rodrigo Fonseca Classificado no boca a boca da Berlinale com adjetivos elogiosos como "devastador" e "impressionante", a coprodução Colômbia x Brasil "Los Conductos", exibida na seção Encounter, ultrapassou a fronteira dos rótulos subjetivos, do gosto e do encanto mais imediato ao se consolidar como vencedora do prêmio de melhor filme de estreia no fim do festival alemão. Com direção do colombiano Camilo Restrepo (de curtas como "Cilaos"), o longa-metragem acompanha a jornada de um jovem fora das CNTPs morais e emotivas, Pinky, em busca da liberdade, numa trajetória mediada por fantasmas. Em seu DNA, a brasilidade traz a marca de inquietação do diretor carioca Gustavo Beck, que trabalhou como produtor neste projeto de Restrepo. Conhecido como cineasta por seu trabalho em .docs carregados de poesia como "O Arquipélago" (2014) e "Chantal Akerman, de cá" (2010, codirigido por Leonardo Luiz Ferreira), Beck trabalha há anos como delegado do Festival de Roterdã na busca de longas latino-americanos. Ele e seu sócio André Mielnik produziram "Los Conductos" apostando na estética virulenta e vívida de Restrepo. Na entrevista a seguir, Beck explica o processo de viabilizar uma narrativa que pões diferentes nações das Américas em conexão.

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Como é a experiência de coprodução com a Colômbia e como foi a troca criativa na construção da dramaturgia do filme de Camilo Restrepo? Gustavo Beck: Acompanhamos o cinema do Camilo Restrepo há algum tempo e era notório o nosso interesse em trabalhar com ele. Nossos países compartilham mazelas semelhantes, mas a economia estética de Camilo, sua virulência e simplicidade ao tratar dos temas de segregação social, pobreza e violência, pareceu-nos sempre absolutamente original e autêntica. Existia desde o primeiro momento um roteiro do que seria produzido e uma urgência para que fosse filmado de encontro com a disponibilidade do não-ator Pinky naquele momento, então nossa contribuição foi a de apoiar o projeto que já se encontrava em estágio de desenvolvimento. Nossa contribuição criativa deu-se de forma mais contundente na montagem, onde a análise corte a corte foi mais intensa e presente.

De que maneira o prêmio de Berlim coroa a consolidação de uma nova estética, a de Restrepo, e, de certa forma, um modelo de troca de produção entre os dois países? Gustavo Beck: A consolidação de um autor como Camilo Restrepo revela que modelos de produção baseados no desenvolvimento criativo de projetos autorais não se esgotou, mas que encontra um novo ciclo virtuoso. Existe uma clara demanda por propostas particulares e desafiadoras, que fujam de convenções óbvias e repetitivas que predominam em especial após a ascensão das plataformas de streaming. Embora exista uma tendência clara de colaboração entre parceiros latino-americanos, não vemos uma conformação absoluta entre um país ou outro, mas uma busca constante por vozes e projetos instigantes ao redor do mundo. Onde for possível produzir, vamos buscar produzir.

 

Qual é a aposta de (ou na) experimentação que seu cinema (como diretor e produtor) vem fazendo ao longo dos últimos anos e, em que medida, uma narrativa que tangencia o Real, como "Los Conductos" reforça essa busca por narrativas que fujam/ driblem convenções narrativas? Gustavo Beck: O eterno debate entre documentário e ficção caiu por terra cada vez mais nos últimos anos. Falamos hoje de um cinema híbrido, mas era algo que, de uma maneira ou de outra, vinha praticando nos meus filmes. "Los Conductos" aprende, a partir da experiência de Pinky, a criar um filme particular, que não se pretende documentar, nem ficcionalizar propriamente os eventos da vida dele. O que Camilo apresentou ali foi cinema, pura e simples, em sua artesania estilística, em seus efeitos e truques. O que busquei com meus filmes como diretor, e agora busco nos filmes que produzo, é acompanhar a evolução da forma cinematográfica dentro daquilo que me interessa mais: olhar para o outro e colocar o mundo e os sentimentos em movimento.De que maneira a sua experiência com Roterdã, buscando novos títulos e novas formas de representação do real (e do imaginário), modificaram sua lógica como diretor e produtor? Gustavo Beck: Trabalho como curador de cinema já há mais 10 anos. Não somente para Roterdã mas também para outros tantos festivais na Europa e na América Latina. Passo o ano inteiro a ver filmes e a decodificar as tendências que surgem ou que se repetem. Naturalmente, tenho um certo entendimento de como posicionar os filmes no mercado internacional de cinema. Mas, quando me lanço a produzir, é acima de tudo, para encontrar os filmes a que gostaria de assistir.

 

Quais são seus projetos novos como diretor e produtor? Gustavo Beck: Como realizador, desenvolvo há alguns anos o meu primeiro longa-metragem de ficção: "Ilha Grande". Ainda está em fase de gestação, mas posso adiantar que é um filme que trata sobre a expansão da violência e conflitos sobre a terra. Como produtor, ao lado do meu sócio André Mielnik, no momento estamos finalizando o segundo longa-metragem de Leonardo Mouramateus: "A Vida São Dois Dias", uma espécie de comédia sci-fi filmada em Lisboa, Rio de Janeiro e Fortaleza. Em montagem, temos o longa-metragem de estreia do realizador argentino Manque La Banca, "Esquí", um híbrido sobre a gentrificação da cidade de Bariloche, coproduzido com a produtora argentina Un Puma, além de ter tantos outros projetos em desenvolvimento.

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