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De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

Falando das coisas boas do Festival do Rio: Cuenca passa da palavra à 'autogeografia' filmada

Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
Entre ficção, metalinguagem e autogeografia, "A morte de J. P. Cuenca" é uma das narrativas mais ousadas da Première Brasil em 2015, na mostra Novos Rumos Foto: Estadão

É difícil conciliar espaço e tempo diante da competição de longas-metragens de ficção e documentário da Première Brasil do Festival do Rio para que se prestigie com o devido respeito e carinho a seleta de filmes da mostra Novos Rumos. Não é erro da organização: é assim em qualquer grande maratona cinéfila que se impõe por um binômio de quantidade e qualidade, com mais de 200 títulos. Hoje por exemplo tem o trabalho mais recente de um dos maiores nomes da novíssima geração: o cearense Petrus Cariry, no jogo com Clarisse ou Alguma Coisa Sobre Nós Dois. É um filme com a afrodisíaca Sabrina Greve, cujo talento justifica, de véspera, boa expectativa. Mas de tudo o que passou nessa seção, inspirada na Un Certain Regard, de Cannes, veio já um filme obrigatório: A Morte de J. P. Cuenca, dirigido pelo próprio, num exercício orgânico (e provocativo) de poliamor fílmico, ao misturar ficção, documentário, vida e autogeografia.

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Romancista conhecido por livros de prestígio como Corpo Presente e O Dia Mastroiani, o carioca de 37 anos flana das Letras para a imagem filmada construindo um thriller de si mesmo. Em 2008, sua certidão foi encontrada junto a restos mortais desconhecidos, na Lapa. Com base nesse fato, Cuenca se propôs um desafio: fazer uma autoanálise cinematográfica, nos moldes do que Polanski fez em O Inquilino. O resultado é um suspense que mais parece filme romeno, bom de ver por seu ritmo sinuoso e seu domínio apolíneo da aeróbica por trás do verbo enquadrar.

De óculos. Cuenca vira autor-ator em seu primeiro longa como realizador: maturidade para enquadrar Foto: Estadão

Generoso na sensualidade, o longa é um exercício policialesco que flerta com o humor adotando como objeto a cidade do Rio em suas transformações e seu abandono. Nessa arquitetura de estados físicos e existenciais, Cuenca se constrói como autor-ator, numa interpretação lynchiana, com jeitão de Inspetor Clouseau em um tiro no escuro da invenção. Ao longo de sua jornada, ele convida personalidades da Cultura como o ex-delegado e hoje diretor do Festival de Cine Música de Conservatória Ivo Raposo e o professor de Jornalismo Literário da UFRJ Paulo Roberto Pires para atuar consigo (este aliás numa cena impagável).

É um filme maduro, produzido por Felipe Bragança Marina Meliande, que merece destaque maior no futuro.

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