Em dez anos de militância do festival pela manutenção e pela diversidade do cinema de animação brasileiro, o que mais evoluiu, em termos industriais e estéticos, no setor, em nossa produção? Julio Cavani:
Esses dez anos foram verdadeiramente revolucionários para a produção brasileira de cinema de animação. O exemplo máximo foi a indicação ao Oscar conquistada pelo longa-metragem "O Menino e o Mundo", de Alê Abreu. Isso além dos prêmios vencidos por esse e por outros filmes brasileiros em Annecy, o principal festival do mundo dedicado à animação, que homenageou o Brasil em 2018 justamente por causa desse bom momento. Isso tudo ocorreu devido a uma soma de fatores, como as novas tecnologias digitais, o fortalecimento de festivais como o Animage e os estímulos dos editais públicos. É um fenômeno percebido no cinema e também no mercado de TV e internet, com o sucesso de séries como "O Irmão do Jorel" e a pernambucana "Mundo Bita".
Que tendências a seleção deste ano aponta em linhas temáticas e em técnicas? Julio Cavani:
Acho que a tendência é a heterogeneidade. Os filmes estão cada vez mais diversos. Ao mesmo tempo em que percebemos um número maior de documentários, que usam recursos da animação para construir alegorias baseadas em depoimentos reais (como o longa "Zero Impunity" e o curta "Sangro"), também vemos uma radicalização no experimentalismo em direção a uma maior liberdade expressiva com filmes que exercitam o nonsense ("Psiconautas" e "My Entire High School...") ou subvertem recursos técnicos ("Tux and Fanny").
O que o Bruno Collet carrega de mais significativo em sua representação da memória? Julio Cavani
: No curta "Mémorable", no lugar de transmitir uma mensagem pessimista ou trágica, Collet faz uma bonita analogia entre a perda da memória e a pintura expressionista. Ele consegue retratar o processo de abstração vivido pelo cérebro de forma extremamente poética a partir de recursos visuais que só a linguagem da animação é capaz de proporcionar.