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Angola renova a fé de Locarno no cinema

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Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
Cena de "Nossa Senhora da Loja do Chinês", longa angolano que concorre na mostra Cineasti Del Presente de Locarno Foto: Estadão

RODRIGO FONSECA Nada do que se viu nas telas do 75º Festival de Locarno, em 2022, é mais inventivo do que o filme angolano "Nossa Senhora da Loja do Chinês", que marca o desabrochar do que pode vir a ser uma das carreiras mais criativa do cinema contemporâneo, visto o vigor da direção de Ery Claver. É uma potente entrada de Angola na cena dos grandes festivais, construída como crônica de costumes, a partir de uma montagem nervosa. A chegada de uma estátua da Mãe de Jesus a um 1,99 de Luanda deflagra uma mudança em uma série de pessoas acossadas pelo desamparo. Animado pela visão da Padroeira, um rapazinho vai fazer uma vingança, uma mãe vai buscar fazer as pazes com seu luto e um culto nada sagrado há de surgir. É o roteiro mais inventivo de Locarno.Como você avalia a trajetória de Angola nas telas e como seu filme se liga a essa tradição? Ery Claver: Não temos uma tradição grande. Eu me arriscaria a dizer que, em 15 anos, fizemos uns três longas com uma carreira sólida. E temos uma cultura mais aberta ao documentário. Eu venho da TV e resolvi dirigir um longa de ficção que parecesse um conto de fadas malfadado.Qual é o simbolismo da mãe de Jesus na trama? Ery Claver: Temos sobre nós uma influência cristã católica longa que, hoje, se vê rodeada pelo avanço dos templos evangélicos. Temos uma Virgem Maria que é mais decorativa, que nos leva a pensar em nosso estado cultural, pré e pós-colonial. Eu queria que o chinês que vende a estátua da santa fosse uma espécie de Grilo Falante a contar essa história, que dialoga com o realismo mágico.Que cidade se desenha nesse filme? Ery Claver: Luanda desafia a realidade de uma maneira com a qual a própria ficção tem dificuldade de concorrer.

O diretor Ery Claver  Foto: Estadão

Abrilhantada por uma ousada presença brasileira, com "Regra 34", de Julia Murat, a disputa pelo Leopardo de Ouro de 2022, encontrou seu filme mais terno (e mais exuberante) na Costa Rica: "Tengo Sueños Eléctricos", de Valentina Maurel. Sua trama se concentra na reestruturação afetiva de uma família, após uma separação, com foco no processo de amadurecimento de uma adolescente criada num ambiente artístico. Eva (Daniela Marín Navarro) e seu gato são amigos inseparáveis que passam por problemas depois que a mãe decide expulsar o felino de seu lar. A saída par a menina é viver com o pai: um tradutor e aspirante a poeta (Reinaldo Amien Gutiérrez) que não parece muito disposto a crescer, mas ama a filha sobre todas as coisas. A fotografia de Nicolás Wong Diaz é um assombro, em sua habilidade de dialogar com códigos do realismo. Locarno chega ao fim neste sábado.

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