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Pequenas neuroses contemporâneas

Opinião|quero ver petra sorrir

Atualização:

 

Existem 2 caminhos na encruzilhada da tragédia pessoal: fugir dela ou enfrentá-la.

Muitos optam por esquecer, superar, virar a página, seguir em frente.

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Outros preferem cutucar em todas as feridas não cicatrizadas e descobrir se há motivos para as peças aprontadas pelo destino.

ELENA, o filme, que estreia sexta, é fruto da coragem de enfrentar um drama pessoal, dolorido, e de não guardá-lo para si, nem esquecer.

PETRA COSTA, irmã de Elena, a diretora, resolveu entender aquela marca no passado, que mudou a vida dela e de toda a família: o suicídio da irmã.

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Elena Andade era a mais linda de todas. A conheci quando tinha menos de 20 anos. Era a mais gata da escola, a que melhor dançava, representava. Filha de uma família de ex-militantes do PCdoB, perseguida na Ditadura, que fundava o PT, comandava um jornal e uma revista, em que trabalhei, Elena era pós-hippie, sedutora, ousada, livre, sorridente. Daquelas garotas que, quando chegam, todos notam.

E vivia o sonho de um novo Brasil, que se abria e se libertava.

Se mudou para Nova York para estudar teatro. Se alguém daquela turma deveria fazer teatro, era ela.

Então, chegou a notícia que tirou o chão de todos que a conheciam.

Ninguém entendeu a sua morte. Os últimos com quem ela conversou pelo telefone diziam que ela estava deprimida, solitária. Mas ninguém suspeitou que ela chegaria aonde chegou.

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Marília, sua mãe, foi amparada pelos amigos. A tentação de entrar num labirinto de culpas era enorme. Foi militar, trabalhar com jovens.

E Petra, uma criança, cresceu, cada vez mais se parecia fisicamente com a irmã.

Sorria pouco, falava com uma voz baixa, parecia tímida.

Parecia uma adulta num corpo de adolescente.

Parecia carregar um peso nos ombros.

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Era inquieta e curiosa.

Foi fazer teatro como a irmã. Aqui na PUC - SP. Foi fazer Cinema. Foi morar fora. Na Europa. Depois em Nova York, como a irmã. Foi desvendar a irmã.

Para, através do exercício da procura, entender o mundo e a si mesma. Para entender a vida, relendo a morte.

Fiz o mesmo em Feliz Ano Velho e Não És Tu Brasil, livros em que, indisfarçavelmente, procurei entender o que tinha acontecido com meu pai.

Entendo [e admiro] o que a pequena PETRA fez. Quando me disse que faria um documentário sobre a irmã, eu a abracei e disse: "Vai fundo!"

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Ela foi. Dentro daquela menina tímida, tinha muita força e coragem acumulada.

Quero ver PETRA sorrir agora.

Opinião por Marcelo Rubens Paiva
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