Marcelo Rubens Paiva
19 de fevereiro de 2015 | 17h39
Oscar…
A gente sabe que é uma bobagem, não premia os melhores, mas adoramos a festa.
E palpitar.
HOTEL BUDAPESTE é um “incrível filme incrível”. Lindo. Mas, é a tal história: comicidade não tem o prestígio de um drama de lencinho.
No “incrível filme incrível” lindo falta aquele soco no estômago.
Tô errado?
BOYHOOD é genial. Não só por ter sido filmado em 12 anos, mas por retratar as muitas fases (atribuladas e ricas) de uma criança e adolescente em 12 anos, o amadurecimento cheio de crises, e como isso afeta a vida dos pais.
Algo que poucos comentam em Boyhood: vimos em 12 anos a evolução da tecnologia de informação na vida das pessoas; quando filmavam há 12, dez, oito anos, não sabiam o que viria a seguir, o que ficaria obsoleto. Ninguém sabia.
Dos games às redes sociais.
No passado, a mãe fala: “Se sentir saudades dos amigos, pode trocar e-mails com eles.”
Mas quando filmavam, mal sabia que e-mail não seria mais trocado por essa geração.
Anos depois, ao levar um pé da namorada, ele “saiu” do Facebook.
Deve estar no WhatsApp.
Ficou de fora INVENCÍVEL (indicado só a prêmios técnicos, como o de Fotografia), história real incrível. O filme da Angelina Jolie é bom, mas meio canastrão, como ela. Muito chororô. Faltou verdade.
O JOGO DA IMITAÇÃO tem o mesmo problema. Outra história real incrível. Mais musiquinhas melosas, cenas em que os conflitos se resolvem no último segundo, e um drama que se perde: é sobre loucura, guerra, matemática, o berço do computador ou perseguição aos homossexuais, ou tudo ao mesmo tempo?
FOXCATCHER tem um problema: a história real (inacreditável) é infinitamente melhor do que a adaptada; ali, Hollywood decidiu reinterpretar a loucura do herdeiro John du Pont à sua maneira, adocicou demais e deixou os personagens imbecilizados, quando na verdade não tinha nenhum trouxa naquela tragédia.
Dos candidatos ao Oscar, existem dois filmes inteligentíssimos, BIRDMAN, do Alejandro Iñárritu, e o argentino RELATOS SELVAGENS, do Damián Szifrón.
Szidfrón mostra personagens comuns que perdem o controle e partem pra vingança, apesar do contrato social exigir serenidade e perdão.
Vai concorrer ao Oscar de filme estrangeiro com o filme russo, LEVIATÃ, um pouco óbvio: referência pós-URSS ao livro Leviatã, Thomas Hobbes, que popularizou o ditado pré-socrático “homo homini lúpus” (o homem é o lobo do homem); sem um estado forte, absoluto, centralizado, os homens se destroem.
O cartaz é a carcaça de uma baleia encalhada. Um império todo-poderoso ou um submarino nuclear se deteriorando.
Iñárritu fez um filme que parece um plano sequência, com uma trilha que é o solo de uma bateria (que não concorre ao Oscar).
Fez arte inigualável, para protestar contra o rumo da própria indústria de entretenimento.
Em BIRDMAN, um ator que ficou famoso na franquia de um super-herói que voa, Birdman 1, 2 e 3 (Michael Keaton, que fez Batman em 1989 e Batman Returns em 1992), desiste de fazer a versão 4.
Vai para a Broadway adaptar, dirigir e atuar num drama baseado num conto de Raymond Carver.
Quer provar que é, sim, um grande ator. Aluga o teatro em cujo palco esteve Marlon Brando. Contrata gente de teatro. Teme a crítica do New York Times, que certamente vai demolir a peça. Mas anda pelas ruas, e o povo só quer saber de Birdman.
Eu tenho popularidade, minha vida afetiva é um desastre, mas eu posso e quero mostrar que sou mais. O próprio super-herói olha para nós, espectadores, e nos pergunta se o preferimos em um sucesso garantido ou num teatro. Popularidade ou prestígio, cultura digerível ou arriscar?
Raymond Carver morreu em 1988. Na sua tumba, está escrito:
“And did you get what you wanted from this life, even so? I did. And what did you want? To call myself beloved, to feel myself beloved on the earth.” (E afinal você conseguiu o que queria dessa vida? Consegui. E o que você queria? Me considerar amado, me sentir amado nessa terra.)
Melhor filme do ano.
Até aparecer SNIPER AMERICANO…
Meu favorito. Filmaço.
Vai ver e me conta.
Não vi todos.
Mas vou palpitar.
Melhor filme: Sniper Americano
Melhor diretor: Alejandro Gonzáles Iñárritu (Birdman)
Melhor ator: Steve Carell (Foxcatcher), genial!
Melhor ator coadjuvante: Robert Duvall (O Juiz), um veterano sempre leva um.
Melhor atriz: passo; vi apenas 1 dos 5 filmes das atrizes indicadas
Melhor atriz coadjuvante: Patricia Arquette (Boyhood); barbada.
Melhor filme em língua estrangeira: vou torcer para o argentino, mas vai dar Ida (Polônia), drama sobre perseguição a judeus na II Guerra; Hollywood adora. O russo não ganha, depois do que eles fizeram na Ucrânia; ganhou Globo de Ouro, votado por correspondentes “estrangeiros”.
Melhor roteiro original: Alejandro G. Iñárritu, Nicolás Giacobone, Alexander Dinelaris Jr. e Armando Bo (Birdman); Boyhood corre por fora.
Melhor roteiro adaptado: Jason Hall (Sniper Americano)
Melhor fotografia: Robert Yeoman (O grande hotel Budapeste); barbada.
A sorte está lançada.