Quem deu a ordem?
Esta é a maneira de identificar os maus?
Separar os brigões dos torcedores de verdade?
Como podemos reviver esta cena?
Como deixamos ela acontecer?
Como não superamos estágios da Civilização?
É assim que se combate a violência?
Esta é a resposta do Estado?
O Brasil não se liberta do seu passado?
Ela não foi abolida?
Para que servem os estatutos as leis a ética o bom-senso a(de) agentes do Estado?
Que Estado é esse que não concilia, agride?
Vai ficar por isso mesmo?
Liberaram os assassinos de Carandiru. E estes policiais indignos serão reexaminados, julgados e punidos?
Generalizar é fazer justiça?
Se eu estivesse entre eles, e costumo me sentar entre eles, estaria ali?
Se meus filhos, sobrinhos, amigos, que costumam se sentar entre eles, estivessem ali, eu não conseguiria manter a serenidade, como muitos pais, irmãos, mães e filhos, ontem.
Isso nunca vai acabar?
Ri, satanás Castro Alves [Navio Negreiro]:
Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!..."
E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...