Marcelo Rubens Paiva
26 de abril de 2011 | 11h57
KASSAB descobriu o que faltava para agilizar as obras para a realização da Copa do Mundo em São Paulo.
A criação de + uma secretaria.
Não é piada, não.
Pois então ele empossou ontem GILMAR TADEU ALVES à frente da nova pasta: SECRETARIA ESPECIAL DE ARTICULAÇÃO.
Agora sim, as obras andarão.
Agora vai!
E já no primeiro discurso, ALVES mandou:
“Esse estádio [o Itaquerão] é nossa única opção. Nosso objetivo é que ele esteja pronto já para a Copa das Confederações.”
Esqueceram de avisá-lo que o próprio CORINTHIANS, dono do estádio, não conta com ele para a abertura do evento de 2013.
Se os gregos não tivessem inventado a burocracia, nós, brasileiros, inventaríamos.
Somos apegados à ela, dependentes dela.
Adoramos secretarias, ministérios, gabinetes e seus anexos.
É a melhor coisa, quando não sabemos por onde começar.
E este secretário empossará um sub, e assim vai.
Talvez no final da cadeia, o continuo nós diga: “É, vai ser possível não fazer esta Copa aqui.”
Então criaremos o quê? A Secretaria da Desarticulação.
Ou melhor: A SECRETARIA ESPECIAL DE ARTICULAÇÃO DA DESARTICULAÇÃO.
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Ou a Copa do Mundo de 2014 será o maior fiasco da história dos mundiais, tirando o da Colômbia, que não aconteceu, ou a mais improvisada. Já falam até em instalar puxadinhos nos aeroportos.
E, pior, não teremos quem responsabilizar, pois as decisões para levantar o evento não foram centralizadas. Conclusão que se tem quando vemos as declarações do Ministro dos Esportes, Orlando Silva, que afirma, como se eximindo da responsabilidade:
É uma copa federalizada.
O governo cria condições de financiamento através do BNDES e foca as atenções nos aeroportos. Estados e Prefeituras fazem as obras de transporte e infraestrutura. PPPs erguem estádios. E todos esperam que a FIFA abra o cofre.
Se tudo desse certo, teríamos trens, metrôs, BRTs e VLTs espalhados pelo Brasil, e aeroportos modernos e acessíveis. Mas, a cada dia, uma notícia desanimadora.
Minha aposta é que talvez role apenas os BRTs, Bus Rapid Transit, nosso conhecido busão-sanfonado que anda por corredores exclusivos. Com cobrador.
O trem-bala ligando Rio – São Paulo, agora avaliado em 50 bilhões de reais, teve mais uma vez a licitação adiada. Está na cara e no bolso que é inviável.
Já estava meio óbvio que não sairia do papel e fazia parte de um delírio dentre tantos de uma campanha eleitoral. Como o aero-trem, de Levy Fidelix.
Mas temos garantido, sim, um belo folder, a Matriz de Responsabilidades, assinado por muitas autoridades, algumas que nem estão mais no Poder. E representantes da Casa Civil, Infraero, Secretaria de Portos, ministérios do Planejamento, Esporte, Fazenda e Cidades, FIFA, CBF, secretarias estaduais e municipais das cidades-sede envolvidas no evento e “compromissadas”.
Se algo der errado, o vilão estará dissipado entre 12 Estados, 12 Prefeituras, 12 empreiteiras e centenas de burocratas.
Pode ser uma Copa com a cara do Brasil: muito sonho, muita burocracia, muito cacique, pouca ação e um futuro mais uma vez adiado.
Sem problemas. Culparemos os chatos dos hippies, que se preocupam demais com o meio ambiente, embargaram obras e não deram licenças ambientais, prejudicando a farra.
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Desde o início, o brasileiro, que sempre sonhou em trazer de volta o evento que mais o mobiliza e mais traumatizou a nação em 1950, estranha as decisões tomadas por alguém- que não sabemos exatamente quem.
Foi a costura da aliança política de Lula que o espalhou entre 12 cidades? Na África do Sul foram 9.
Por que Natal, se em Goiana, por exemplo, há três times tradicionais que se revezam nas séries A e B? O Ministério Público já questiona a viabilidade do Estádio das Dunas. Por que Cuiabá, que tem pouca tradição no futebol?
Por que Manaus, e não Belém que abriga um ótimo estádio, o Mangueirão, e dois times de tradição, Remo e Paysandu, sendo que um deles fez história ao derrotar o Boca em La Bombonera?
Por que um quarto estádio em PE, a 19 quilômetros de Recife, prognosticado futuro elefante albino, se já existem três na cidade, dos três grandes times, Náutico, Sport e Santa Cruz?
Aliás, o Arruda, do Santa Cruz, o segundo maior estádio privado do País, recebeu recentemente a seleção brasileira e tem um gramado que, brincam os torcedores, é ovacionado.
O Maracanã recebe outra reforma bilionária. Não tinham pensado nisso na reforma da abertura do Pan? E trocarão a cobertura tombada por lona. As obras do Mané Garrincha, de Brasília, já foram interditadas pelo Tribunal de Contas do DF.
Por fim, o Itaquerão, o polêmico estádio construído sobre um terreno irregular, em que passa um oleoduto, e que precisa da aprovação da Câmara dos Vereadores. Sem contar a linha de metrô abarrotada que o liga ao resto da cidade.
Tinha o Morumbi, estádio mal construído por um arquiteto de prestígio, que pelo visto não costumava ver jogos no campo. Tinha o Pacaembu, estádio paixão da cidade, com projetos na gaveta para ser ampliado feitos pelo próprio Corinthians.
Dentre as responsabilidades do governo de SP, uma já saiu do papel: a cidade anunciou a instalação de 272 câmeras de segurança. Por enquanto, é só.
Faltam dois anos para a Copa das Confederações e três para o Mundial.
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Dá na pinta que as obras de mobilidade urbana não avançarão em tão pouco tempo. Talvez os estádios fiquem prontos em cima da hora. Se tudo sair como a encomenda, teremos enfim estádios cobertos e dignos do nosso futebol, depois de décadas em que o torcedor tomou chuva na cabeça, e alguns elefantes brancos.
Penso em sugerir a intervenção da sociedade brasileira neste fiasco aparentemente iminente.
E escalar voluntários para ajudar os controladores de voo (nerds viciados em videogames) a pousar e taxiar aviões. Podemos oferecer galpões ao redor dos aeroportos para guardá-los. Iremos todos carregar malas dos turistas que chegam.
Podemos hospedá-lo em nossos condomínios fechados- no quarto do filhão, despachado para a casa dos avós.
Vamos priorizar os que têm infra de clube, como piscina e academia, e nomes em inglês, como São Paulo Cool. Prédio com nome em inglês é o que não falta.
Levaremos os torcedores de carro para os estádios. E buscaremos na saída. E aos domingos estarão no almoço de família discutindo a relação e as diferenças entre Messi e Neymar, Massa e Alonso, e a política externa de Lula e Dilma.
Eles nunca se esquecerão do sabor da nossa lasanha e do calor da nossa hospitalidade.
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Falando nisso, alguém já calculou a invasão turística proporcionada pelo filme Rio?
Ele bate recordes de bilheteria aqui e lá fora.
O fenômeno de Carlos Saldanha, que traça um retrato positivo em 3D da cidade, lidera até a bilheteria americana.
Divertido, não coloca tapumes nas nossas favelas, nem nos problemas sociais.
E é piada atrás da outra.
Apesar de alguns falarem que tem muitos clichês.
O problema é a gringaiada querer ver araras azuis passeando entre praias, montanhas e rodas de samba.
Será que, para não decepcioná-los, não é melhor começarmos a tingir urubus de azul e enfeitar mergulhões como se fossem tucanos?
Taí mais um vilão para a insana bolha imobiliária carioca.
Se antes eram as novelas de Manoel Carlos, que inflacionavam os alugueis no Leblon e Ipanema, agora será “aquele desenho daquele cara da Era do Gelo”.
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