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Opinião|Vive la France!

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Atualização:

Matéria minha no Caderno 2 sobre o festival Panorama do Cinema Francês, com convidados e oito filmes que serão apresentados no Cine Reserva Especial, lá na Avenida Paulista:

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Sempre é bom quando o cinema francês chega ao Brasil. Mais ainda quando vem, como agora, num pacote de oito filmes, amostragem significativa do que está sendo feito por lá atualmente. Alguns desses títulos já foram mostrados em festivais, como O Segredo do Grão, que participou de Veneza no ano passado, O Escafandro e a Borboleta e Canções de Amor, concorrentes de Cannes, em maio. Outro traz de volta um nome de grande prestígio, como Lady Jane, de Robert Guédiguian. A Última Amante é o novo trabalho de Catherine Breillat, diretora que já esteve no Brasil e aqui mostrou o polêmico Romance, com cenas de sexo explícito. Molière traz episódio de juventude do dramaturgo francês, e Satã representa o gênero horror. Por fim, um documentário, O Advogado do Terror, discute um personagem enigmático, Jacques Vergès, tido ora como anticolonialista, ora homem de extrema direita.

Dessas atrações, alguns destaques. A começar por Lady Jane, que abre a mostra, e traz Guédiguian em seu ambiente conhecido, Marselha, a cidade do sul da França. Como de hábito, o clima empregado é tenso, seco. Muriel (Ariane Ascaride), dona de boutique, conversa pelo celular. Aos poucos, o espectador se dá conta de que há um seqüestro em andamento. Mas Muriel não é uma simples vítima de extorsão. Nem ela e nem seus amigos François e René são exatamente inocentes.

Lady Jane (nome da loja, tirada da canção dos Stones) parece um filme de gênero, um policial tenso, mas vai muito além disso. Não apenas pela maneira como manipula a história, entregando a trama a conta-gotas, como pelo conteúdo social que faz questão de evocar, a cada passo. A vida das periferias marselhesas se desvela, com a luta pela sobrevivência, a dor, as estratégias de afirmação social nem sempre ortodoxas. Como em todo filme de Guédiguian, este também respira um forte sentimento humanístico, na forma de compaixão pelos personagens por pouco exemplares que eles possam ser.

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Também ambientado no sul da França, O Segredo do Grão, de Abdellatif Kechiche, mergulha na realidade da comunidade árabe de Sète. O veterano trabalhador do cais, Slimane é expelido do emprego, pois esse já não comporta homens de 60 e poucos anos. Como sobreviver? Talvez abrindo um restaurante, pois sua ex-mulher é exímia cozinheira de cuscuz. A pretexto de construir essa pequena história de luta pessoal, Kechiche entra na intimidade das famílias franco-árabes, mostra seu modo de vida quase à maneira de um documentário. É também um filme intenso e comovente; caloroso, sem nunca ser piegas. A atriz Hafsia Herzi, que vem ao Brasil, dá um show em cena. No sentido literal e no figurado. Foi premiada em Veneza.

No filme sobre o teatrólogo francês, que ficou com quilométrico título de As Aventuras de Molière, Um Irreverente e Adorável Sedutor, Laurent Tirard descreve um episódio de juventude do autor de O Doente Imaginário e O Burguês Fidalgo. Nota-se a intenção do cineasta de mesclar vida e obra do retratado, imaginando Molière contratado por um burguês casado que deseja conquistar uma amante difícil. O expediente seria encenar uma peça que falaria do seu desejo e, para tanto, ele precisa de ajuda profissional. O tom farsesco não disfarça a ironia com que Molière tratava a sociedade de seu tempo.

A Última Amante é também um filme de época. Ambientado na mundana Paris do século 19, evoca a época libertina anterior. Um jovem dom-juan deseja se casar com uma bela flor da aristocracia, mas não consegue tirar da cabeça a amante espanhola Vellini - na verdade interpretada pela italiana Asia Argento. Um filme de clima, de sensualidade e de sutil comentário sobre a paixão sensual. Para os padrões de Catherine Breillat, até que é bem-comportado.

(Caderno 2, 19/6/08)

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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