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Opinião|Suprema, a juíza que mudou a lei em favor das mulheres

Filme de ficção e documentário celebram a juíza norte-americana que lutou pela igualdade de gêneros nos Estados Unidos

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Felicity Jones encarna a juíza Ruth Bader Ginsberg Foto: Estadão

Ruth Bader Ginsburg é uma pop star em seu país. Talvez você já tenha ouvido falar dela, uma juíza da Suprema Corte americana, de 85 anos, veterana de lutas feministas e responsável pela manobra jurídica que mostrou a inconstitucionalidadede diferenças entre pessoas baseadas no gênero. Ruth é tão famosa que ganhou um documentário, RGB, suas iniciais, ainda inédito no Brasil, e o longa de ficção Suprema, em cartaz, na qual é interpretada pela atriz Felicity Jones.

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Suprema é uma cinebiografia convencional, mas que tem atrativos por sua personagem. Felicity encarna a mocinha obstinada e inteligente, que abre caminho próprio num mundo dominado por homens. Estuda Direito em Harvard e depois em Columbia. Em um meio masculino, ela e outras oito colegas, eram a exceção. Numa das cenas (parece que baseada em fato real), o reitor de Harvard convida os alunos novatos para uma recepção em sua casa e, em dado momento, pede às calouras para justificar porque haviam escolhido ser advogadas, "tirando vagas de homens que poderiam muito bem estar aqui". Esse, o nível de agressividade.

Formada em primeiro lugar, Ruth vê seus pedidos de emprego caírem no vazio. Frustrada, dedicou-se à vida acadêmica e, no auge das manifestações feministas, lecionava uma matéria sobre as discriminações de gênero.

Sua grande sacada foi assumir um caso que aparentemente pouco tinha a ver com seus objetivos. Era apenas um caso fiscal, um homem que tomava conta da mãe inválida e tentava abater do imposto de renda as despesas com uma cuidadora de idosos. Era-lhe negado esse direito, por ser homem. Mas, se fosse mulher, não teria nenhum problema. Ora, levando esse caso ao Supremo, Ruth consegue demonstrar que havia discriminação de gênero. E, se a discriminação de gênero era inconstitucional nesse caso, seria também em todos outros em que as vítimas fossem mulheres. Uma sacada brilhante e que alterou a jurisprudência norte-americana.

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A juíza Ruth Bader Ginsberg Foto: Estadão

No auge do sucesso, Ruth foi convidada para integrar a Suprema Corte durante o governo de Bill Clinton. Hoje é hostilizada pela extrema-direita que ocupa a Casa Branca. A mulher é um ícone liberal.

Com roteiro escrito por um sobrinho da juíza e dirigido pela cineasta Mimi Leder, Suprema (título original On the Basis of Sex) conta sua história de maneira correta. Não deixa de ser uma hagiografia, mas é um perfil breve de uma pessoa de fato extraordinária.

Feminista, Ruth nunca negou que o apoio recebido pelo marido Marty (Armie Hammer) foi fundamental para sua carreira. Recíproca verdadeira. Também advogado, Armie, ainda no tempo de estudante, enfrentou um câncer que o impedia de ir às aulas. Ruth tomava notas nos cursos em que ele estava matriculado e as transmitia ao marido que, assim, não ficava defasado. Curado, Marty tornou-se um famoso advogado fiscal em Nova York.

Tanto no documentário como na ficção, ouvimos Ruth pronunciar sua frase mais famosa: "Não quero nada em favor do meu gênero, quero apenas que os homens tirem o pé de cima dos nossos pescoços". E ponto.

Em RGB, dirigido por Betsy West e Julie Cohen, várias colegas e amigas dizem que Ruth sempre defendeu as causas feministas, mas não era dada a manifestações ou atos de reivindicação. Preferia outro caminho. Encontrou uma brecha jurídica e, através dela, forçou uma nova interpretação da Constituição. Mudou tudo.

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Há muitas formas de luta. Ruth escolheu agir dentro do sistema e, pela percepção de uma contradição interna, modificá-lo. 

 

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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