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Cinema, cultura & afins

Opinião|Simplesmente uma Mulher

Marilyn (Sienna Miller) sustenta o marido desempregado e ela própria perde o emprego. Voltando para casa, o surpreende na cama com outra. Mona (Golshifteh Farahani) é uma imigrante atormentada pela sogra, pois, supostamente, não pode ter filhos. Por circunstâncias diversas, as duas mulheres, que são conhecidas sem chegar a ser amigas, botarão juntas o pé na estrada em busca de uma coisa das mais simples - existir.

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Eis aí a trama inicial de Simplesmente uma Mulher, de Rachid Bouchareb, diretor de filmes como Fora da Lei e London River. Com esse ponto de partida, o cineasta coloca em jogo mais do que um ato de liberação feminista. Por isso, chamar Simplesmente uma Mulher de Thelma & Louise dos anos 2000 pode ser um apelo fácil à memória do espectador, mas deixa algumas coisas de fora.

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Deixa, talvez, o essencial. Porque, se é verdade o que Bouchareb mostra - ou seja, que os desafios de afirmação da mulher permanecem ainda vivos -, ele dá um passo a mais ao introduzir a questão da diversidade cultural. E de maneira sutil.

A história é ambientada nos Estados Unidos e não em algum pouco democrático país do Oriente Médio. Estamos na terra da liberdade individual e, no entanto, os preconceitos e a violência atingem tanto a imigrante árabe de família tradicional quanto a norte-americana pura, de sangue anglo-saxão.

Uma é desprezada porque, ao que todos julgam, é incapaz de gerar uma vida em sua barriga. A outra, por não ser, aos olhos do marido, senão fonte de sustento e, depois, quando foge, torna-se uma mulher sozinha e portanto "fácil", sexualmente desfrutável. Num mundo ainda fálico, apesar de todas as aparências contrárias, a condição feminina indica fragilidade, possibilidade de uso e abuso, quando não de violência pura e simples.

O cinema de Rachid Bouchareb, para quem o conhece, é feito de simplicidade. Não pratica o rebuscamento nem formal e nem de conteúdo. Ele é correto. E, com admirável poder de síntese, discute ideias com eficácia e sem impor conclusões fechadas. O uso de um final aberto sugere que não existem respostas fáceis e nem remédios universais. Tudo depende da evolução cultural das sociedades e, como se sabe, estas andam a passos de tartaruga e, muitas vezes, de lado ou para trás.

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Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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