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Cinema, cultura & afins

Opinião|O sabor dos bastidores do show biz

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Paulo Machado de Carvalho Filho lembra histórias que testemunhou em São Paulo, como diretor de TV e empresário

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Luiz Zanin Oricchio

É uma São Paulo de outros tempos que emerge da leitura deste Histórias... que a História não Contou, de Paulo Machado de Carvalho Filho (Companhia Editora Nacional, 200 págs. R$ 45, organizado por Carlos Coraúcci). Uma São Paulo do rádio e da fase heróica da televisão, mais glamurosa, sede de grandes momentos da música popular brasileira e que conseguia atrair para cá celebridades do star system internacional da época, como Marlene Dietrich, Nat King Cole, Maurice Chevalier, Louis Armstrong e Sammy Davis Jr.

O livro não é uma autobiografia de Machado de Carvalho, filho do célebre Marechal da Vitória da Copa de 1958 - é mais um apanhado de casos que ele, como diretor de rádio e televisão, e empresário de sucesso, viveu e agora relata. O volume vale não apenas pelas histórias divertidas, mas também pelo material fotográfico que o ilustra. O autor viveu, como ele diz, 50 anos enfurnado no meio artístico. Sua experiência começa nos anos 40, portanto na época pré-TV do show biz brasileiro, ou que nome pudesse ter essa atividade em sua fase incipiente.

O mais saboroso da prosa de Paulo Machado de Carvalho, ou Paulinho, como amigos e funcionários o chamavam, está no relato dos bastidores das grandes contratações que traziam ao País os astros da época. Ficamos sabendo, por exemplo, que a passagem do mitológico Louis Armstrong por São Paulo foi das mais tumultuadas. Hospedou-se o monstro sagrado no Hotel Jaraguá, então o melhor da cidade, e estrategicamente localizado próximo do Teatro Paramount, na Avenida Brigadeiro Luis Antonio, onde ele iria se apresentar. Só que na hora do espetáculo, teatro lotado, o astro não aparecia. O empresário foi ao hotel, acompanhado de um amigo forte, um certo Vavá. Encontraram o Satchmo em seu quarto, com uma máscara de beisebol na cabeça e dizendo que não iria. Vavá disse apenas que ele se aprontasse o mais rápido possível, pois se não fosse tocar iria apanhar e muito. Diante de tal argumento, Armstrong reconsiderou e foi ao teatro, onde entrou sob vaias devido ao atraso. Mas, quando tirou do trompete mágico as primeiras notas do St. Louis Blues, tudo lhe foi perdoado.

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Outro que deu alteração foi Sammy Davis Jr. Paulinho foi chamado ao telefone e o gerente do hotel lhe disse que havia 'um probleminha' com seu hóspede. O probleminha é que Sammy havia ligado para uma namorada na Suécia e o curso tomado pela conversação aparentemente não o agradou. Tanto assim que destruiu, minuciosamente, a suíte onde estava hospedado.

A já madura Marlene Dietrich esteve aqui em 1959 e marcou a estadia paulistana por uma excentricidade. Dias antes do espetáculo, La Dietrich, perambulando pela noite da cidade, conheceu um playboy local que se notabilizava por andar para lá e para cá em companhia de um lince de estimação, preso a uma coleira. No dia da estréia do espetáculo, Marlene exigiu que se arrumassem dois lugares, e na primeira fila, para o amigo e seu bichinho. E assim foi feito, senão não haveria show.

Não falta espaço no livro para o casting nacional. Paulinho Machado de Carvalho fala da cantora Maysa e de como conseguiu contratá-la durante uma bebedeira. O empresário fingia que bebia, e Maysa, bem, quem a conheceu sabe que entornava como gente grande. Vemos o retrato de Hebe Camargo em seu início de carreira, nos anos 40, e também a do hilário Adoniran Barbosa, que, como recorda o autor, além de grande compositor, era cômico de mão cheia e chegou a trabalhar no cinema, em O Cangaceiro.

Também são lembrados os festivais de música popular e sua importância naquele momento histórico do País. Machado de Carvalho recorda o episódio célebre da disputa entre A Banda e Disparada, no Festival da TV Record de 1966, em que se adotou a decisão salomônica de dividir o prêmio entre as duas canções.

O livro não é uma análise de período e nem uma História sistemática dele. São apenas histórias, com agá minúsculo, relatadas com muito sabor por uma testemunha privilegiada, que viveu para contá-las.

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Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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