Foto do(a) blog

Cinema, cultura & afins

Opinião|O Demônio de Neon

PUBLICIDADE

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

 

Perdi o filme o ano passado e fui atrás porque O Demônio de Neon aparece em terceiro lugar no top ten de 2016 dos Cahiers du Cinéma, logo à frente de Aquarius e atrás de Toni Erdmann e Elle.

PUBLICIDADE

Bem, soube que provocou polêmica em Cannes e dividiu a crítica. Dei uma olhada nas cotações francesas: vai de cinco estrelas (obra-prima) a uma estrela (péssimo).

E o filme? Logo na primeira cena vemos uma garota imersa num mar de sangue. Tem um corte no pescoço, o sangue se acumula em poças sob o divã. Mas é tudo fake. Trata-se de um ensaio fotográfico para o book de uma modelo iniciante.

A garota, Jesse (Elle Fanning) vai tentar a sorte a sorte em Los Angeles. E encontra aquele ambiente da moda, uma selva voraz de inveja, puxadas de tapete, egos monstruosos (e inseguros) e, claro, o culto à beleza acima de tudo e por qualquer método. Jesse tem 16 anos mas é aconselhada a dizer que tem 19. Menos que isso, seria menor de idade; mais, seria uma velha.

Sua maquiadora é Ruby (Jena Malone), bastante interessada na modelo, até demais, como se vê depois. As outras a invejam e hostilizam. Em especial porque em Jesse tudo é natural. As outras buscam a perfeição por cirurgias sucessivas. Jesse veio ao mundo desse jeito.

Publicidade

Passa pelo filme uma atmosfera de artificialismo, talvez adequada para aquilo que o diretor dinamarquês Nicolas Winding Refn quer dizer. Planos longos, movimentos de câmera lentíssimos, mulheres em poses artificiais, cenários de plástico, vidas de plástico.

Já perto do fim, o filme dialoga com o cinema de gênero e mesmo com o trash. Há uma estética do sangue e Refn dela usa e abusa. É provável que, sem a última meia hora, o filme não provocasse tanta polêmica. Mas não seria o que diretor queria, sem dúvida.

A impressão que dá é de um diálogo muito íntimo com a estética fashion, com a violência cosmética, clima de perversão sexual (chegando à necrofilia) e sequências de lesbianismo chique.

Tudo isso não basta para convencer, assim me pareceu. Não se trata do tema. Diz-se que a história é velha: menina inocente chega à cidade grande e é devorada, etc. Mas todas as histórias são velhas, a diferença está na maneira de contá-las. E Refn escolhe a sua, tomando um ambiente deletério não com visão de todo crítica, mas com uma certa fascinação. Poderia chamar o seu filme de Jesse que a Cidade Comeu. De forma literal. (Não esqueçamos do filme de Maurice Capovilla Bebel, Garota Propaganda, baseada no romance de Ignácio de Loyola Brandão Bebel que a Cidade Comeu).

É perturbador em alguns momentos, esquecível em outros.

Publicidade

Existe por aí em várias plataformas se você quiser conferir. No Now, por exemplo.

 

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.