Foi legal também rever O Cobrador, de Paul Leduc, que já havia visto ano passado em Veneza. Legal, apesar da projeção sofrível. Baseado em contos de Rubem Fonseca, tem com atores principais o brasileiro Lázaro Ramos e o norte-americano Peter Fonda. Leduc diz que quis falar na globalização da violência, essa moeda comum que percorre o mundo e tem curso em qualquer país. Não por acaso, o filme tem como subtítulo a divisa In God We Trust, confiamos em Deus, presente nas notas de dólar.
Mas não se pense por isso que o filme tenha qualquer antiamericanismo brucutu, ou mensagem política simplista. Dilui as histórias de Fonseca em uma versão não-linear e às vezes de compreensão mais difícil, pelo menos por quem busca cinema com princípio, meio e fim (nessa ordem) como ficou claro no debate, com os espectadores perguntado ao diretor pelo significado de determinados "símbolos" presentes no filme. A meu ver, não há simbologia alguma, o filme é claro e, embora apresente alguns problemas de estrutura, passa seu recado de forma límpida.
O que acontece é simples: Leduc faz parte de uma geração pouco submissa à linguagem dominante do cinema. Seus melhores filmes - Frida - Natureza Viva, Reed - México Insurgente e Barroco - refletem essa vocação de inventor. Isso coloca algumas dificuldades de recepção. Por outro lado, beneficia a imaginação de quem se dispõe a seguir seus filmes, mesmo que eles não se entreguem de maneira fácil. Nesse tipo de cinema, o receptor constrói para compreender. E sua compreensão é sempre parcial, relativa e pessoal.
Não se trata de um cinema impositivo.