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Opinião|Irina Palm

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

A ousadia de Sam Garbarski não é na linguagem cinematográfica. Irina Palm é apenas bem filmado e eficaz. Seu ponto mais positivo está no desafio que encara. Garbarski deseja encontrar a dignidade lá onde menos se espera. No mundo dos peep shows, da sexualidade comprada, dos solitários de corpo e espírito. Acrescente-se um desafio a mais. É nesse ambiente, permissivo com a juventude e intolerante em relação à velhice, que ele joga com seu personagem.

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Deve-se dizer uma palavra sobre Marianne Faithfull, que interpreta o papel-título. Ela é superlativa. Mesmo porque, num filme que não se pretende visualmente apelativo, tem de representar suas emoções com o rosto. E por ele passam a surpresa, o asco, o tédio e depois a rotina, talvez.

Mas quem é essa Irina Palm, nom de guerre de Maggie (Marianne)? Uma senhora de meia-idade que encontra uma maneira pouco ortodoxa de ganhar dinheiro. Ela precisa de grana não para si mesma, mas para financiar viagem e hospedagem de seu neto à Austrália, onde ele poderia se tratar de uma doença rara. Só que Irina já passou daquela idade em que as pessoas podem encontrar um emprego regular, se tiverem sorte e contatos. Viúva, sem currículo, uns 50 anos, ela está à margem da sociedade moderna de produção e consumo; precisa desesperadamente de dinheiro. O que fazer? É o que ela se pergunta e, obviamente, sua vida muda de figura quando dá de cara com o estabelecimento conhecido por Sexy World e seu feliz proprietário, Miki (Miki Manoljovic).

Se você pensar bem, haveria muitas armadilhas previsíveis no caminho de um filme como esse. O mau gosto, o preconceito, a caricatura e, o último deles, o pudor excessivo. Pois bem, Garbarski (diretor de O Tango de Rasheviski), se não dirige um grande filme, também não resvala nunca fora dos domínios da dignidade. Numa situação indigesta, usa a arma do humor para driblar pontos mais difíceis. E, mesmo nos desdobramentos finais, quando o métier de Irina já se tiver tornado rotineiro para o espectador, e portanto a história irá pedir algo mais para avançar, o filme não será decepcionante.

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Apesar de convencional, o estilo empregado por Garbarski não deixa de ser significativo. E adequado. Se a personagem era uma mulher tímida e de meia-idade, sem qualquer experiência no que estava fazendo, a melhor maneira de conseguir a empatia do espectador era aproximá-lo. Por isso, o ambiente íntimo, de domesticidade, mesmo no interior atroz do Sexy World. E talvez o uso da câmera na mão seja apenas uma coincidência irônica com o esforçado trabalho de Irina Palm, pseudônimo profissional de Maggie.

(Caderno 2, 5/4/08)

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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