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Opinião|Godard na Cinemateca

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Matéria minha hoje no Caderno 2:

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Num tempo em que o gosto do público anda cada vez mais conformista, é de se perguntar qual será o destino de uma retrospectiva consagrada à obra de Jean-Luc Godard, o anticonfomista por definição. Bem, é possível pensar, com algum otimismo, que atrairá um público cinéfilo, sempre disposto a conhecer ou a reencontrar filmes que saiam do padrão mais convencional.

Nesse sentido, a mostra será exemplar, pois traz tanto o Godard mais 'famoso', como o de Acossado, O Desprezo, O Demônio das Onze Horas (vulgo Pierrot, le Fou), quanto o desconhecido de, por exemplo, Longe do Vietnã, longa no qual ele dirige um dos episódios, com colegas como Chris Marker, Claude Lelouch, Alain Resnais e Joris Ivens, entre outros. No meio-termo, há o Godard 'parcialmente' conhecido, diretor de obras tão fundamentais quanto Viver a Vida, O Pequeno Soldado e Uma Mulher É uma Mulher.

Não por acaso, o primeiro filme da mostra é possivelmente aquele mais famoso - Acossado, de 1960. Pode até não ser o melhor Godard, mas é um filme que se vê com encanto até hoje. De fato, como resistir ao fascínio da história de amor entre o pequeno bandido Jean Paul Belmondo e a garota americana residente em Paris, Jean Seberg?

Nesse filme, Godard incorpora - de maneira crítica - a admiração que tinha por um certo cinema americano, usando-o em contraposição ao cinema literário francês, que ele e sua geração abominavam. Em oposição a esse cinema que cheirava a museu, Godard faz um filme pleno de frescor, de câmera nervosa, uma aventura urbana repleta de citações e arestas narrativas. Pierrot le Fou é um contraponto a Acossado, feito cinco anos depois e protagonizado também por Belmondo. O mesmo 'tema', o casal em fuga, porém com motivos (no sentido musical) diferentes, incorporando a maior complexidade da trajetória do artista.

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Dois anos depois, de Pierrot le Fou, outra obra famosa de Godard - A Chinesa, de 1967, tida como 'precursora' do maio de 1968. Recolhe, à maneira descontínua de Godard, a discussão da época entre a linha chinesa de Mao Tsé-tung e da União Soviética. O fato de algumas das discussões do filme terem retornado um ano depois nas ruas de Paris expressam menos a capacidade de previsão do cineasta que a sua atenção ao clima político do tempo.

Nem sempre era assim e o Godard extremamente radical da fase do grupo Dziga Vertov foi mais uma exceção que a regra em sua carreira. Há algo em comum entre fases distintas: da epifania de Viver a Vida à ficção científica de Alphaville, Godard é sempre um desafio colocado à inteligência do espectador.

(SERVIÇO)Serviço Retrospectiva Jean-Luc Godard. Sala Cinemateca. Lgo. Senador Raul Cardoso, 207, 5084- 2177 (ramal 210). De hoje a 11/2

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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