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Cinema, cultura & afins

Opinião|Encontros com filmes notáveis

Por falta de espaço, ainda não consegui escrever no jornal sobre alguns filmes notáveis da Mostra. Em particular, Irène, de Alain Cavalier, Vincere, de Marco Bellocchio, e Singularidades de uma Rapariga Loura, de Manoel de Oliveira.

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Sem somá-los na mesma coluna, são todos filmes não apenas dignos de atenção, mas extraordinários na maneira como se utilizam do cinema para expressar o que seus autores desejam.

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Em Singularidades, Oliveira faz um filme aparementente retrô (uma Lisboa parece que saída dos anos 50 ou 60) mas que de fato é um agudo estudo sobre o desejo. A garota da janela em frente; o leque com ela se mostra/esconde do pretendente. O mistério que existe em todo objeto do desejo. Tudo filmado com a precisão, o rigor de um mestre. Aos 101 anos, Oliveira não cessa de nos surpreender. Por sua argúcia, pela simplicidade e leveza.

Com Vincere (Vencer), Bellocchio faz seu filme mais operístico, em tons fortes, viscontiano às vezes, dialogando com a música o tempo todo. A história da mulher e filho de Mussolini, renegados quando ele sobe ao poder, é comovente. Mais ainda pela presença de Giovanna Mezzogiorno no papel principal, o da "louca" que não desiste do seu Duce. Filme político na melhor expressão do termo, não deixa também de ser uma psicanálise selvagem do bom povo italiano e sua fascinação por homens fortes. Vide Berlusconi, alusão contínua de Vincere.

Irène, de Alain Cavalier é o relato, em primeira pessoa, de um estupendo trabalho de luto feito pelo diretor para sua mulher. Irène, por quem ele era apaixonado, morreu num acidente de carro. Cavalier mantinha um diário no qual registrava seu relacionamento com a esposa. Ele serve de base a essa revisita a uma história de amor, com suas ambiguidades, sua delicadeza, às vezes sua violência. Os mortos se vão. Desaparecem. Algo deles fica nos objetos, nas fotos, na memória. De tudo fica um pouco, dizia um verso de Drummond. "Às vezes um botão; às vezes um rato", se não falho na transcrição do verso. De qualquer forma, Irène é extraordinário.

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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