Bonito filme, aliás, que revisita a viagem feita pelo arquiteto Fernando Távora em 1960 - daí o título. De âmbito memorialístico, viaja por vários países e continentes, Brasil inclusive, escolhendo a cidade de São Paulo, e detendo-se, no final, na obra arquitetônica do seu ídolo, Frank Lloyd Wright, no estado de Wisconsin, Estados Unidos. Imagens em super-8, que sempre dão a impressão da pátina do tempo, concomitantes a um registro irônico e mesmo ferino, que tenta descaracterizar a viagem como mero turismo. Viagem como descoberta dos outros e de si, como laboratório da vida.
1960 havia sido precedido por dois curtas - Frascos, de Ariana Nuala, e Ecce Homo, de Clodoaldo Lino - e dois longas, O Mercado de Notícias, de Jorge Furtado, e Getúlio, de João Jardim, este fora de concurso.
Já havia visto os dois longas, e revê-los não foi perda de tempo. Ao contrário. Getúlio, cujo personagem-título é vivido por Tony Ramos, reafirmou-se, na minha percepção, como um raro drama histórico sólido brasileiro. A tendência local é glorificar ou vilanizar personagens e, ao mesmo tempo, encontrar um tom didático que facilite a compreensão de um suposto público ignorante. Getúlio dribla todas essas falsas direções. Dá ao processo histórico, que culmina com o suicídio, sua espessura devida e mostra personagens com seus merecidos matizes. Voltaremos ao filme, que estreia neste 1º de março.
Já O Mercado de Notícias é uma brilhante reflexão sobre o poder da mídia contemporânea. Como se sabe, a mídia reflete sobre tudo, menos sobre si mesma. Pois bem, com este documentário, vê-se obrigada a se enfrentar. O filme entremeia entrevistas com alguns jornalistas muito conhecidos (Mino Carta, José Roberto Toledo, Luis Nassif, Renata Lo Prete, etc) e trechos de uma peça de Ben Jonson, da época elizabetana. Questões básicas dos impasses da mídia são debatidos: relação com as fontes, credibilidade, a busca da verdade, a politização da notícia, a espetacularizacão do noticiário, o desafio da internet. Temas indigestos, que ganham destaque no estudo de dois casos: a cobertura do atentado ao então candidato José Serra que foi submetido a uma tomografia depois de levar uma bolinha de papel na cabeça. E a "denúncia"de que existiria um precioso quadro de Picasso exposto em condições inadequadas nas dependências do INSS - na verdade, trata-se de uma cópia barata, dessas que se podem comprar nos museus por 10 dólares (o original encontra-se no Guggenheim, de Nova York). E, no entanto, tornou-se objeto de reportagens indignadas com a malversação de um bem público.
Por certo o filme vai incomodar muita gente. E é ótimo que assim seja.
Os curtas. Frascos, de Araiana Nuala, joga, de forma lúdica, com as noções de conteúdo e continente. É legal.Ecce Homo, de Clodoaldo Lima, tenta ser criativo em sua denúncia de crueldade com animais. As cenas são chocantes. Todas de matadouro o são. Fôssemos pensar muito nisso e nunca mais comeríamos uma picanha.