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Opinião|Diário do Cine PE 2013 Alguns toques sobre os longas-metragens

RECIFE - Na correria do festival, pouco tempo para postar. Aliás, o tempo, cada vez mais escasso, com quase as 24h do dia preenchidas por compromissos. Tempo para reflexão? Nenhum. Nem mesmo para escrever. Enfim, o negócio é eleger prioridades. O diabo é que não queremos perder nada. O inferno nos tenta com a ambição intelectual. Ver todos os filmes, participar de todos os debates, conversar com o máximo de pessoas. Quando vai se ver, acabou-se o dia, para não dizer a saúde.

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Dito isso, passemos ao que interessa. Duas comédias, logo no começo do festival: Giovanni Improtta, de José Wilker, e Vendo ou Alugo, de Betse de Paula.

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Dois momentos diferentes da comédia, na verdade. Wilker retoma, como diretor e ator, seu personagem da TV, o bicheiro Improtta. Tem um belo começo de cinema, mas depois cai. Como não provocou muitos risos, Wilker disse que não era comédia. Enfim, pode ser visto como uma farsa da ascensão social. Mas não dá lá muito certo.

Melhor é Vendo ou Alugo que, como foi dito no debate, não fosse pelo tom, poderia ser tido como um drama à brasileira. Maria Alice (Marieta Severo) tenta vender o casarão da família para pagar as contas. É uma espécie de fábula da decadência da aristocracia. A matriarca, muito bem interpretada por Natália Timberg, é viúva de um diplomata. Convive-se com trambiques, tráfico de drogas, etc. É um pouco o Rio atual, mas de maneira não crítica, como apontou uma jornalista.

De qualquer forma, a comédia à brasileira anda em busca de credibilidade crítica. O sucesso não lhe basta. Os dois filmes foram bem discutidos, isto é, reservou-se pensamento para tentar analisá-los. O que não quer dizer que possam ser consagrados, como já andou sendo dito por aí, num exercício incrível de maniqueísmo. Ou não se levam os filmes em consideração. Ou, quando se levam, já se começa a dizer que "os críticos deram o braço a torcer". Que pobreza...

Um bom documentário sobre Mazzaropi, de Celso Sabadin. Bem pesquisado, mas teve gente que não gostou do início um tanto didático, tentando definir o que é o conceito de caipira, para então entendermos o fenômeno Mazzaropi. Observação parecida à feita sobre as comédias. Uma coisa é levar em consideração o fenômeno popular de Mazzaropi. Outra, é consagrar seus filmes como obras-primas, que obviamente não são.Esse tudo ou nada é sintoma da crise de pensamento no Brasil.

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Já Orgulho de Ser Brasileiro, de Adalberto Piotto, é muito fraco. Depoimentos de algumas pessoas sobre o orgulho ou vergonha de ser brasileiro pouco esclarecem sobre o tema. Vira um achismo danado. Um falso choques de opiniões quando, obviamente, poucos segmentos da população foram ouvidos. O técnico Carlos Alberto Parreira, FHC, a geneticista Mayana Zatz, uma dondoca de Miami cujo nome não me ocorre, Gerald Thomas, etc.Tédio puro. E a questão é gigantesca, e diz respeito à nossa problemática autoimagem. Fica para outra ocasião.

Mais um documentário, Rio Doce-CDU, de Adelina Pontual, este da cota pernambucana. Estranhou o título? Eu também. Mas se morássemos no Recife saberíamos que é uma linha de ônibus, que corta a cidade, de Olinda à Cidade Universitária. Trajeto de 38 km. Sempre lotado, com os mais diversos tipos populares entre os passageiros, passando por bairros pobres, medianos, afluentes. Um corte transversal nessa metrópole que, ainda linda, vai se tornando caótica.

Por fim, Bonitinha mas Ordinária, releitura da peça de Nelson Rodrigues dirigida por Moacir Góes. Bom elenco e uma direção baseada em closes e planos seqüências, atualizam o clima proposto por Nelson Rodrigues. Para lembrar: Edgard (João Miguel) é um contínuo que gosta de Ritinha (Leandra Leal), mas recebe proposta milionária para fazer um casamento de conveniência com uma ninfeta estuprada por cinco negros na favela. A tal ninfa, Leticia Colin, é uma parada federal. Gracindo Jr. faz um milionário devasso. As questões de Nelson estão lá: o sexo desligado do amor, a ética desafiada pela tentação do dinheiro fácil. Era um moralista, mas não oportunista como os de hoje. Paradoxalmente, é um Nelson Rodrigues com final feliz e redenção do personagem. Mas até chegar a certa luz há muita treva no caminho. O filme tem umas cenas grotescas, mas é inesperadamente bom.

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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