Foto do(a) blog

Cinema, cultura & afins

Opinião|Diário de Veneza 2011: O Espião que Sabia Demais

Um bom romance de espionagem, adaptado de maneira correta, é sempre atraente. Ainda mais quando o ficcionista atende pelo nome de John Le Carré e o cineasta, no caso o sueco Tomas Alfredson, faz o seu trabalho de modo a não estragar o texto. O resultado é esse ótimo Tinker, Tailor, Soldier, Spy, mais uma reflexão ficcional de Le Carré sobre a Guerra Fria, ou o seu fim, o que dá no mesmo. Seu alter ego, George Smiley, é interpretado soberbamente por Gary Oldman. E o elenco de apoio é composto de nomes estelares como Colin Firth, John Hurt, Tom Hardy, Mark Strong e Benedict Cumberbatch. Ou seja, é um espetáculo de luxo.

PUBLICIDADE

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Na história, Smiley está retirado do serviço (foi forçado a sair, na verdade) mas é reconduzido quando se descobre que existe um infiltrado trabalhando no coração mesmo do serviço de informações. A sua missão será encontrar o traidor entre seus ex-colegas de MI-6. Como tal, terá de se haver com amigos, ou pelo menos conhecidos dos "bons tempos" de luta. Um dos diálogos diz muito, quando um deles se refere à época áurea da espionagem, nos anos 60. O outro diz que o saudosismo não se justifica porque era um tempo de guerra. A que o primeiro responde que, pelo menos, era uma guerra boa e clara. O duplo agente trai por nostalgia, e esta não é uma hipótese improvável.

PUBLICIDADE

"O filme é um ensaio sobre o homem, fala de sacrifício, de solidão, de alienação e moralidade", diz Gary Oldman, na compreensão exata de que um romance de ação de John Le Carré sempre traz embutidas questões éticas da política - em tempos de paz ou de guerra. Mais ainda em guerra, quando o próprio Le Carré atuou no "serviço" e pôde observar de perto o efeito que a condição de agente traz para o ser humano que assume esse papel. Ao contrário do glamour de outros espiões fictícios, os de Le Carré são tipos comuns, usando ternos surrados, óculos fora de moda, ganham pouco e têm existência cinzenta e sem vida social. A adaptação de Alfredson para o livro que em português se chama O Espião Que Sabia Demais (1974) tem classe.

 

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.