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Opinião|Diário de Gramado - o calor de Os Amigos

 

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

GRAMADO - Sem qualquer trocadilho climático, mas Gramado bem estava a merecer o calor de Os Amigos, o novo longa de Lina Chamie.

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Basicamente, é um dia na vida de Theo (Marco Ricca). Ele tem de ir ao enterro de um amigo de infância, depois segue para o seu escritório de arquitetura, desloca-se pelo caos de São Paulo. Encontra-se com amigas, entre elas Maju (Dira Paes), com quem sai à noite e troca confidências. Entre os fatos "reais" da vida (e da morte), Theo evoca cenas de infância. Convive com crianças e animais. Desloca-se por uma trilha sonora bonita, na qual predominam trechos do Carnaval dos Animais, de Saint Saens.

Como outros filmes de Lina - Tônica Dominante e Via Láctea - este também é uma obra de impressão e poesia - não fosse ela filha do grande poeta Mario Chamie. Lina também é musicista de formação. Move-se bem nesse universo dos sentimentos. Nos quais as coisas doem e fazem sentido numa linha um tanto abaixo da supefície, do explícito. Forma um contraponto interessante ao cinema de hoje, no qual a brutalidade ou a mediocridade formam os pólos extremos.

Há um diálogo com várias vertentes da cultura. Theo não tem esse nome por acaso. Mas está longe de ser um deus. Encontra-se perdido, frágil. É desse jeito mesmo que ficamos quando morre um amigo de infância. Um pouco de nós também se vai nessa morte. Rouba-nos alguma coisa, como quando se vão os pais, ou quando mudamos de país. A história, portanto, fala de perdas. E fala também de amizade, sem a qual não somos nada.

Mas como também é cheia de crianças, e de animais, fala também em esperança, em regeneração, em uma certa necessidade de aceitação sábia daquilo que é limitado e diz respeito à nossa própria finitude. Para tanto, o roteiro dialoga tanto com a mitologia grega quanto a mitologia contemporânea (os super heróis). Fala da Odisséia, mas fala também do Ulisses do século 20, escrito por James Joyce, e que torna herói o homem comum, o banal, maravilhoso em seu deslocamento pela Dublin no dia 16 de junho.

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Enfim, são muitas as referências. Lê-las pode enriquecer o filme. Mas não é indispensável. É tudo muito simples. Ao mesmo tempo muito complexo e comovente. Como nossas vidas mesmas, quando pensamos nela. Quando temos tempo de pensar nelas.

 

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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