GRAMADO - Dois momentos de grande emoção na serra gaúcha - a apresentação de Repare Bem, de Maria de Medeiros, e a coletiva da equipe no dia seguinte. O longa, dirigido pela atriz e cineasta portuguesa, centra-se na figura de Denise Crispim, viúva de Eduardo Leite, o Bacuri, barbaramente torturado e morto pela ditadura. Denise, que também foi presa política, saiu do Brasil, exilou-se no Chile e depois na Itália, onde reconstruiu a vida. Quando Bacuri foi assassinado, Denise estava grávida de Eduarda, que hoje mora na Holanda.
Essa tragédia brasileira é narrada num filme despojado e pungente, baseado quase exclusivamente no longo depoimento de Denise, uma mulher de rara coragem, que não esconde a emoção ao lembrar sua trajetória e a do companheiro morto.
No debate, respondeu às perguntas dos jornalistas com a mesma franqueza, comovendo a todos. Ou a quase todos, pois houve também quem insinuasse que a solidariedade a Denise pudesse ser sintoma de "sentimento de culpa da esquerda"e "ranço stalinista". Enfim, como a boçalidade está ao alcance de todos, e hoje milita nas melhores redações, deixemos isso prá lá.
Maria de Medeiros foi questionada sobre o aspecto tosco do filme. E respondeu muito bem, dizendo que seria obsceno estetizar com movimentos de câmara elaborados e suntuosos o que aquela mulher tinha a dizer. É basicamente um filme da palavra. Mas, só? Não. Isso significaria ignorar a expressão facial de quem depõe, a sinceridade impressa no rosto de quem sofreu tanta violência e não se nega a confiá-la. Para o benefício da nossa história. Ou, pelo menos para quem acha que a história ainda tem algum sentido.