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Opinião|Deixe a Luz Acesa

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
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Deixe a Luz Acesa, de Ira Sachs, investe na linha existencial dos casais problemáticos.

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O casal, aqui, é formado pelo cineasta Erik (Thure Lindhardt) e o advogado Paul (Zachary Booth). Eles se conhecem em Nova York, onde moram, e partem para um relacionamento que se pretende ocasional, mas que acaba por se estender por dez anos, enfrentando problemas diversos. Entre os quais os principais seriam a insegurança de Erik e o abuso de drogas por parte de Paul.

A ideia é acompanhar essa trajetória de um casal jovem e moderno nessa quadra da vida em que parece imperioso experimentar de tudo, mesmo com risco da saúde ou da estabilidade mental. Essa turbulência existencial se dá em local definido: é um mergulho na cena gay nova-iorquina, embora se note a preocupação em extrapolar os limites do filme de gueto. Erik e Paul frequentam pessoas de toda a espécie, homos e heteros, num ambiente cultural vivo e diversificado demais para se limitar a uma abordagem única.

Num modo de filmagem rápido e também moderno (mas não videoclipado), Deixe a Luz Acesa tem o tom exato do chamado cinema independente americano. Se o "cinemão" é tido como careta (mas isso também é um clichê), o indie pode tocar em temas mais ousados, pode apresentar atores menos conhecidos e mesmo usar uma linguagem cinematográfica menos batida. Em certo sentido, temos de tudo isso no trabalho de Ira Sachs que, no entanto, não chega ser totalmente convincente.

O mal-estar entre os dois - Erik e Paul - parece meio mal formatado. A insegurança de Erik, dinamarquês vivendo nos Estados Unidos, encontra sua contrapartida na autodestruição de Paul, viciado em drogas. Mas tudo parece tão limpinho e sem consequências que o pathos da história parece se esvaziar. É um filme abertamente de limites, com muita clareza de que está transgredindo algumas convenções, mas também não deseja ir tão longe a ponto de ser subversivo. Situa-se então num meio termo que parece convencional demais para o que se deduz fosse a sua proposta de início.

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A título de informação extra filme, sabe-se que Erik é o alter ego do diretor Ira Sachs. Através do personagem, Ira exorciza sua vida ao lado de um escritor autodestrutivo, Bill Clegg, seu companheiro por dez anos. É verdade que Ira não cai no cabotinismo que muitas vezes transforma em desastres as narrativas confessionais. Mas também não dá a ela dimensão dramática suficiente para que os espectadores possam sentir-se participantes das suas angústias e alegrias.

Apesar de algumas cenas fortes, o tom predominante do filme é de distanciamento, que não tem caráter reflexivo, mas parece apenas defesa contra a ameaça de ir longe demais. O público sente essa hesitação.

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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