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Opinião|Cine PE 2016: O Prefeito

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Recife - Com O Prefeito, de Bruno Safadi, o elemento político ingressou no Cine PE. O longa pode ser visto como sátira ao sistema político brasileiro através da figura delirante do prefeito do Rio (Nizo Neto), que sonha civilizar a cidade e, em seguida, transformá-la em país independente.

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Em tom farsesco, o longa é filmado em meio ao Rio transformado em escombros pelas obras preparatórias para a Olimpíada. O "cenário" é o da demolição da Perimetral na região do cais do porto. Lá é montado o "gabinete" do prefeito, que despacha por meio de telefonemas e anota as decisões em seu diário. Seus ídolos são Pereira Passos, tido como maior prefeito do Rio, Jânio Quadros e Getúlio Vargas. Ao mesmo tempo, aparece uma figura mítica, Lilith (Djin Sganzerla) que fornece ao político a pedra da felicidade - o crack.

O filme tem momentos melhores que outros. Em seu delírio, o prefeito aproxima-se do golpista interpretado por Paulo Autran em Terra em Transe, de Glauber Rocha. Deseja impor uma civilização ao país, nem que seja pela força e na marra. Retrato cáustico desse paraíso em crise, no qual o povo é convocado apenas para referendar o que os acordos de elite já estabeleceram.

Curtas - Uma boa noite de curtas, na segunda sessão da mostra competitiva.

O Imperador da Pedra do Reino, de Houldine Nascimento e Wanderley Andrade, traz à cena a figura do grande Ariano Suassuna, umas das figuras centrais da cultura brasileira do século. É um documentário tradicional, com entrevistas e imagens de obras de Ariano transformadas em filmes ou minisséries como Auto da Compadecida e A Pedra do Reino. Mas dá uma boa ideia do universo mítico-sertanejo do criador.

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+1 Brasileiro, de Marcelo Sampaio, é a história de um taxista de bom coração, que acaba de perder a mulher e cria a filha sozinha. O filme inova ao introduzir canções em determinados trechos, transformando-o num quase musical. Talvez inspirado em O que Se Move, do também capixaba Caetano Gotardo.

Minha Geladeira Pensa que é um freezer, de Pablo Polo investe no fantástico satírico. Fernando trabalha num cartório, é casado e mora com a mãe. Sua geladeira começa a congelar tudo, de maneira enigmática. A mãe se intromete, a relação do casal se deteriora e Fernando começa a sentir a pressão psicológica. É habilidosa a maneira como o mal-estar se introduz numa história que parecia banal.

Talvez a pretensão estrague um pouco o que poderia ter sido o mais inventivo curta da noite, This is Not a Song of Hope, de Daniel Aragão. Na história, duas mulheres e um homem. Ele é um músico maldito, em constante atrito com sua cidade, consigo mesmo e com o mundo. Elas são uma pesquisadora holandesa que se encontra no Recife e uma atriz em luta com o restrito mercado de trabalho da cidade. Exasperado, o curta usa técnicas múltiplas, como variações de cor e uso de fotos, descontinuidade e ruptura narrativas. Tem pique. Mas como o diretor talvez se ache um novo Glauber Rocha, arrisca-se sempre a colocar a pique seus projetos.

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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