Luiz Zanin Oricchio
09 de fevereiro de 2009 | 20h27
Dos seis filmes que Carmen Miranda fez no Brasil, o mais memorável é Alô, Alô Carnaval (1936), de Adhemar Gonzaga, no qual contracena com a irmã, Aurora. Carmen e Aurora, de fraque e cartola estilizados, interpretando Cantores do Rádio, música de João de Barro e Lamartine Babo, é imagem que ficou. Tanto assim, que a dupla seria homenageada por Cacá Diegues em seu Quando o Carnaval Chegar, com a mesma música cantada por Nara Leão e Maria Bethânia.
O resto de sua filmografia é norte-americana, a começar por Serenata Tropical (1940) até o último, Morrendo de Medo, de 1953, num total de 14 produções. Vemos as fotos de divulgação desses filmes americanos e não existe nenhuma em que Carmen não esteja com um turbante pouco discreto ou uma sortida cesta de frutas na cabeça. Sorriso rasgado, olhinhos revirados, ladeada de homens; às vezes um só, na maior parte das fotos, vários. Todos os olhares convergem para ela, magnetizados.
Nos EUA, Carmen flutuou à mercê dos interesses da indústria. Em seu primeiro filme se alinhou à então política da boa vizinhança, representando não apenas o Brasil mas todo o continente sul-americano, com o qual os Estados Unidos deveriam permanecer aliados durante a guerra que já acontecia na Europa. Por isso ela interpretava um
Mesmo reinterpretando constantemente esses clichês (ou talvez por isso mesmo), Carmen tornou-se uma das atrizes mais bem pagas de Hollywood, tendo contracenado com bambas da época como Betty Grable, Dom Ameche, Groucho Marx, Jerry Lewis e Dean Martin. Carmen tentou livrar-se desse estereótipo, mas nunca conseguiu. Afinal, ele é que lhe trouxe fama e dinheiro, muito dinheiro, aliás. Desse modo, Carmen era sempre Carmen, a Brazilian Bombshell, no último filme de que participou, Morrendo de Medo, de George Marshall, no qual também aparecem Bob Hope e Bing Crosby. Nele, Carmen interpreta as músicas The Bongo Bing e The Enchilada Man.
O fato de Carmen ter sido renegada no Brasil (“abandonou-nos e divulgou imagem ridícula de nós”), mas ter provocado comoção quando o corpo foi repatriado e enterrado no Rio, em 1955, indica que estamos diante de um signo de alta ambiguidade. Quem tentou entendê-lo foi a diretora Helena Solberg em seu documentário Carmen Miranda – Bananas Is My Business. O subtítulo é em broken english, deliberadamente errado, que a esperta Carmen usava em seu favor, pois fazia parte do seu charme.
(Cultura, 8/2/09).
Obs: esse texto faz parte do dossiê do Caderno Cultura, que marcou o centenário de nascimento de Carmen Miranda, ocorrido hoje, dia 9/2/2009.
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