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Cinema, cultura & afins

Opinião|Cabeça a Prêmio

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:
 Foto: Estadão

Brilhante a estreia do ator Marco Ricca na direção com este longa Cabeça a Prêmio. Um filme de fronteira, bem à maneira de Marça Aquino, que fornece o texto. Aquino já tivera seus Matadores filmado por Beto Brant e agora dá o ponto de partida para um filme de mesmo gênero, pelo menos em seus ingredientes e ambientação.

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Os irmãos Miro e Abilio (Otávio Muller e Fulvio Stefanini são sócios na pecuária, no Pantanal, porém também estão envolvidos no tráfico de drogas, essa tentação criminal da fronteira. Não falta a presença da mulher fatal, bem interpretada por Alice Braga, que se envolve com um dos empregados do patrão. Vários ingredientes são mobilizados para dar clima e tensão à história: o sexo, a sede do dinheiro fácil, a embriaguez do poder - tudo isso mobiliza os personagens e os coloca à deriva, como presas fáceis de si mesmos.

O elenco é, em boa parte, responsável pelo êxito do projeto. Alice é a própria imagem da tentação. Mas Fulvio passa muita verdade com sua figura de fazendeiro obeso, cheio de uma prepotência controlada. Não menos interessante é a atuação de Otávio Muller, no papel oposto, o do frustrado, com sua sexualidade recalcada e em busca de alguma realização. É um competir feroz do irmão e o duelo de interpretações da dupla com certeza um dos pontos altos do filme.

É claro que o mérito dessa escolha de elenco e de sua condução no trabalho conjunto é do próprio Marco Ricca, ele mesmo um ator consagrado, com largo currículo no teatro e no cinema. Consegue dar homogeneidade a um time formado quase inteiramente por craques, incluindo a parte estrangeira do elenco....

Mas também é verdade que, muitas vezes, se tem um elenco de primeira e o resultado, do ponto de vista do cinema, parece frouxo. É que não basta dispor dos ovos para fazer o omelete. É preciso ter noção de que o cinema é uma linguagem em muito diferente da televisão e também do teatro. Nesse sentido, Ricca e sua equipe, mostram um domínio da linguagem cinematográfica, com seus movimentos de câmera e uma vivacidade que dão à história que se conta um ritmo bastante envolvente.

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Deve-se notar que a localização da trama numa região fronteiriça não se dá por razões turísticas. Ela tem uma função primordial. As próprias pessoas envovidas estão numa fronteira de suas vidas, passando de uma região para outra. Da legalidade para o crime, do sol para a sombra, da contenção para a entrega à paixão. Há algo aí como um limite a ser transposto, e numa velocidade que lembra a da droga, da cocaína que sobe à cabeça e transforma alguém limitado em um super-homem para si mesmo. O que é um passo quase sem volta para a catástrofe, como se sabe. Cabeça a Prêmio é um sintoma desse mal-estar contemporâneo, colocado nessa espécie de laboratório existencial e simbólico que é a zona de fronteira.

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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