Armando Nogueira era um elo entre a crônica esportiva literária, que tivera em Nelson Rodrigues seu expoente máximo, e a moderna crônica, que se deseja mais objetiva, mais técnica, talvez mais informativa que opinativa. Falo aqui em Nelson Rodrigues apenas porque o grande dramaturgo era o tipo ideal desse tipo de crônica, na qual brilharam também outros escritores como José Lins do Rego, Paulo Mendes Campos e Carlos Drummond de Andrade.
Armando, discípulo de Nelson Rodrigues, não via qualquer razão para ser objetivo quando escrevia sobre esporte tão subjetivo quanto o futebol. Falo do futebol, em particular, embora Armando fosse íntimo de outras modalidades. Mas era no futebol que exercia melhor seu estilo poético, mesmo porque, sem sugerir qualquer hierarquia de modalidades, o futebol é, de longe, o esporte que mais mobiliza a paixão do brasileiro e de muitos outros povos.
É, portanto, o território do afeto, do sentimento, talvez mais do que podem ser os outros jogos. E então, entendia ele, deveria ser abordado da mesma forma, com os instrumentos da paixão, para que pudesse ser compreendido. Era apenas assim que o escritor poderia estar à altura do seu objeto. E esse, sabemos, é o desafio maior para quem põe em palavras algo que, originalmente, é apenas desforço físico e competição.
Armando sabia ver o poético que havia nesse jogo. O quanto esse o esforço físico comportava de balé, e como a competição se traduzia nas grandezas e eventuais baixezas do espírito humano. Alargou nossa percepção em frases tão lapidares como aquela sobre Garrincha: "Para ele, o espaço de um lenço era um latifúndio". Ou sobre Pelé que "se não fosse gente teria nascido bola".
Com sua visão poética ele nos ensinou a ver um jogo que estava além do jogo. Ao contrário dos tecnoburocratas modernos da crônica, Armando buscava no jogo o que expressava a condição humana. Em suma, da mesma forma que Nelson Rodrigues, Armando Nogueira enxergava a essência do jogo. E sabia transmiti-lo em sua prosa poética. Isso, nós lhe devemos.