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Cinema, cultura & afins

Opinião|Apenas o Fim

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

É típico de uma época de exagero, falta de distanciamento crítico e entusiasmos passageiros como a nossa, mas Apenas o Fim, filme de Matheus Souza, já vem sendo saudado como novo caminho para o cinema brasileiro. Nada menos. Talvez o julgamento hiperbólico faça mais mal que bem tanto ao filme como aos atores e ao próprio realizador. Por outro lado, entende-se a receptividade efusiva, num momento em que não parece haver alternativas entre o drama de conteúdo social e a comédia romântica made in Globo para o cinema nacional. Apenas o Fim entra por outro caminho. É uma produção barata, com uma única locação, dois personagens principais e alguns secundários, que fala de amor, ou do final de um caso de amor.

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Mostra dois jovens (Erika Mader e Gregório Duvivier) em duas situações básicas. Caminhando pelas dependências da PUC-Rio ou num flashback em preto e branco que recorda o passado do casal. Casal que está se desfazendo. Ela lhe diz que irá embora dentro de uma hora. Dá duas alternativas ao rapaz: podem conversar durante esse tempo ou transar, como despedida. O garoto escolhe discutir a relação. E a história se resume a isso. A graça está maneira como tudo é dito e feito. No frescor da filmagem, que não esconde a sua precariedade mas, também por isso mesmo, a sua sinceridade. Enfim, é gosto e cheiro de coisa nova. Até certo ponto.

Por um lado, há um inventário de todo um vocabulário de geração. Toda uma rede de referências tecida em contato com a cultura pop, do MSN ao Orkut, na qual Pokémon e Cavaleiros do Zodíaco podem servir como ferramentas auxiliares para decodificação do mundo. Goste-se ou não, é assim mesmo. Se bem que para espectadores menos antenados nessa espuma efêmera da cultura contemporânea talvez fosse necessário um glossário para entender o que se passa na tela.

Por outro, há a aproximação muito explícita do cinema estreante de Matheus ao cinema veterano de Domingos Oliveira. Existem mesmo pontos comuns. Domingos focou-se se nas relações humanas numa época em que o cinema de qualidade no Brasil se obrigava, como por mandato popular, a esmiuçar a questão social e política. A alternativa vinha com filmes como Todas as Mulheres do Mundo e Edu, Coração de Ouro.

Matheus faz com que o personagem vivido por Duvivier pareça um clone de Domingos quando "se" interpreta. As palavras que se acumulam, as frases surpreendentes, as aproximações repentinas entre a "alta" e a "baixa" cultura - parecem decalcadas da marca registrada de Domingos. Não é que não exista nada de novo sob o sol, como se diz no Eclesiastes. É que parece natural, numa época de reciclagem pop, que a própria noção de novo se relativize.

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(Caderno 2, 15/6/09)

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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