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Opinião|Ao Carlão, que morreu jovem

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Não me sinto lá muito em condição de escrever sobre Carlos Reichenbach, que nos deixou hoje, sem avisar, aos 67 anos. Teve uma parada cardíaca, parece, e morreu antes de ser atendido. Carlão era safenado, mas parecia estar bem. Encontrei-o, pela última vez (mas eu não sabia disso) faz um mês, num seminário do qual ele participou, sobre cinema digital, no Cine Sesc.

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Estava bem, e tão bem que vinha trocando e-mails com minha mulher, que o convidara para escrever sobre Paulo Emilio Salles Gomes num livro que ela está organizando.

Quando o encontrei pela última vez, Carlão estava contente. Eu quase não o reconheci, pois era a primeira vez que o via sem os célebres óculos de fundo de garrafa, sua marca registrada, além da voz rouca. A voz era a mesma, mas Carlão agora estava de cara limpa, sem os óculos. Havia sido submetido a uma operação de catarata e aproveitara para corrigir a miopia. Estava feliz e me recomendou o procedimento.

Enfim, conhecia o Carlão de longa data, mais de 20 anos. Admirava sua obra, e ele sabia disso. Gostava também da sua maneira de estar no mundo, de não envelhecer, de ficar do lado dos jovens, tomar partido dos rebeldes, mesmo os rebeldes sem causa. Sobretudo os sem causa. Carlão era anarquista, um egresso das lutas de 68. Gente assim não envelhece. Morre jovem. Carlão morreu jovem. A generosidade ajuda na conservação da alma, a mesquinhez a envelhece e avilta.

Dos filmes dele, os que mais gosto: para mim, a obra-prima é Filme Demência, sua versão subversiva do Fausto.

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Também gosto muito de Liliam M: Relatório Confidencial. E de Alma Corsária, esse filme libertário e poético, que sacudiu o marasmo estético de um antigo festival de Brasília e acabou levando o prêmio principal.

Dos mais recentes, fico com Garotas do ABC, embora Falsa Loura não me desagrade. Pelo contrário. Tem alguns dos mais inspirados planos do cinema brasileiro recente.

Mas o que é legal mesmo no Carlão é essa união entre o intelectual super bem informado do cinéfilo com a atenção para o caráter popular do cinema. Uma combinação rara.

E mais do que tudo, o Carlão era um grande amigo, uma alma larga e generosa. Poucas mortes em nosso meio foram tão lamentadas.

Fico devendo um texto mais analítico. Fica para depois. Agora é o coração que manda.

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Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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