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Opinião|A cidade do movimento que está quase parando

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Quem vive em São Paulo, ou qualquer megalópole parecida, sabe: só sobrevive quem consegue se isolar um pouco. O segredo é ler alguma coisa no metrô, ou manter um som constante no ouvido, quando isso for possível. No carro, ouvir rádio e ter um bom acervo de CDs em estoque. É a mesma coisa para qualquer meio de transporte. Sobreviver é difícil, numa metrópole caótica que cobra de seus moradores horas e horas de deslocamento em transporte público ou individual. Ambos são ruins.

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Fazemos todo o esforço do mundo para viver na inconsciência dessa situação. Em Trânsito, de Henri Arraes Gervaiseau , coloca o foco sobre a questão e nos obriga a uma atitude contrária, fazendo-nos ver o que desejamos esquecer: somos, na condição de paulistanos, pessoas permanentemente em trânsito. Nosso destino é o movimento, a errância pela cidade imensa, embora esse movimento se torne a cada dia mais problemático e tenda à estagnação.

O filme é também uma radiografia de classes sociais, de como essa condição de 'em trânsito' se reflete, diferentemente, no comportamento de pessoas de poder aquisitivo distintos. Nesse ponto, vai além da proposta inicial e transforma-se em retrato falado (e visual) da sociedade de classes à brasileira, nesta cidade que é síntese da condição nacional.

Assim, ouve (e acompanha, com a câmera) algumas pessoas de classe média alta e sua agruras ao volante de um automóvel em São Paulo. Mas também entrevista moradores da periferia e registra seu longo périplo de casa para o trabalho e vice-versa. Inclusive uma mulher, que foi até matéria de reportagens, e andava 22 quilômetros por dia para economizar na condução. Essa personagem morreu de pneumonia poucos dias depois das filmagens.

Se às vezes, por excesso de generosidade, perde o foco e a estrutura, Em Trânsito é suficientemente denso e amoroso para merecer a nossa atenção. E a nossa reflexão.

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(SERVIÇO) Em Trânsito (Br/2005, 96 min) - Documentário. Livre. Cine Bombril 2 - 18 horas.Cotação: Regular

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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