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Uma geléia geral a partir do cinema

Sorrentino?

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

CANNES - Estah amanhecendo no Brasil (6 h, 11 h daqui) e voces com certeza estaraoh dormindo. Mas se acordarem daqui a pouco e lerem este post entrem no site do festival - www.festival-cannes.fr - que apresenta hoje entrevistas com os presidentes dos dois principais juris, o da competicaoh, Robert De Niro, e o da Camera d`Or, Bong Joon-ho. Ambos pagam tributo ao cinema frances. De Niro lembra que seu primeiro papel no cinema foi no filme de um cultuado diretor da Franca. Eh verdade que, quando fez `Trois Chambres aa Manhattan`, com Annie Girardot, em Nova York, Marcel Carneh nao era mais o autor aclamado de `O Boulevard do Crime`, Les Enfants du Paradis, mas De Niro se lembra da importancia daqueles dois ou tres dias de filmagem, que mudaram sua vida e o fizeram querer permanecer no cinema. Bong Joon-ho, por sua vez, confessa que era garoto quando viu `O Salario do Medo`, de Henri-Georges Clouzot, mas o impacto foi taoh forte que, ateh hoje, ele coleciona copias de DVD do filme em todo o mundo. O festival termina hoje aa noite. Quem vai ganhar a Palma de Ouro de 2011? Varios jornais daqui estaoh estampando uma candidatura que, para mim,. eh surpreendente. This Must be the Palm, proclamam `Nice Martin` e o `Journal du Dimanche`. Paolo Sorrentino, `This Must Be the Place`. Amo o Sorrentimno de `O Amigo da Familia` e `Il Divo`, mas ficaria muito puto se ele ganhasse pelo que me parece um de seus filmes menos logrados (o menos?). Mas `This Must Be the Place` pode se beneficiar de vir na contramaoh das declaracoes desastradas de Lars Von Trier - `Ok, i`m a nazi` - e terminar ganhando a Palma mesmo sem merecer. Na coletiva, o proprio Sorrentino admitiu que o mais improvavel dos cacadores de nazistas seria o personagem de Sean Penn, um astro decadente de rock, que se veste e pinta como mulher e anda feito um zumbi. Penn, no filme ele se chama Cheyenne, aplica ao velho nazista um corretivo exemplar, mas esse naoh eh o tema do filme e sim a jornada que ele empreende atraves da `America` para honrar o pai, esse velho judeu que morreu, sem nunca haver superado a humilhacaoh que o guarda nazista lhe impos no campo de prisioneiros. A jornada, sim, e a relacaoh pai/filho, que esteve em xeque durante todo o festival, percorrendo tantos filmes, saoh os verdadeiros temas de Sorrentino. Estah um lindo dia. Ceu azul, sem nuvens, muito sol. Cannes eh essa miriade, esse sonho de cinema, mas, nos bastidores, informam pequenas notas publicadas em jornais, aqui e ali, hah uma briga de foice para forcar o presidente Gilles Jacob a aceitar sua retraite, a aposentadoria compulsoria. E se Jacob realmente se aposentar, o que ocorrerah com seu delfim, Thierry Fremaux, que assina a selecaoh oficial, escolhendo os filmes da competicaoh e da mostra Un Certain Regard? Os dramas de bastidores compoem uma outra historia de Cannes, 2011. Pode-se apenas imaginar o que terah sido a dor de Jacob, que sempre teve um carinho especial por Lars Von Trier, tendo de excluir o filho favorito. Mas a lei francesa eh clara. Manifestacoes nazistas saoh vetadas no pais. Depois de haver colaborado com os ocupantes durante a 2.a Guerra, a Franca rejeita o passado e ratifica a tolerancia com Hitler como crime contra a humanidade, no que faz muito bem. Shakespeare? Sofocles? Edipo excluido, banido. Na verdade, talvez seja isso que, no limite, vah sobrar de Cannes, 2011. Quando Lars disse aquelas coisas na coletiva, ninguem, na hora, pareceu levar a serio. Todo mundo sabe que eh um provocador. Soh depois que as frases comecaram a sair fora de contexto na imprensa e a TV mostrou as imagens - um braco estendido, como se ele fizesse a saudacaoh nazista, as letras `F-U-C-K` tatuadas nos dedos da maoh direita - foi que o caldo engrossou. Kirsten Dunst, ela, percebeu na hora. Na propria coletiva Kirsten cobriu o rosto com as maos e soltou aquele `Oh, my God!`. Apos a coletiva, hah relatos de que brigou com o diretor. Chamou-o de `stupid`, disse que naoh se pode brincar com aquelas coisas. Quando conversei com Lars em Mougins e ele contou que sua sensacaoh era de derrapar na curva e perder o controle do carro - `Naoh dava mais para parar`, disse -, confesso que me lembrei de Joseph Conrad e Albert Camus. Lord Jim, consciente de que sua covardia no falso naufragio do Patna seria sua danacaoh eterna; Mersault, ouvindo aqueles tiros ressoarem na eternidade. Estou tendo, talvez, um surto poetico, ou literario. Mas o que me doi eh que o filme, `Melancholia`, taoh belo, talvez nunca venha a ser devidamente apreciado por isso. Tergiverso. Daqui a pouco, tenho minha entrevista com Catherine Deneuve. Vou dar uma volta na Croisette, carpe diem, antes de recomecar a correria.

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