RECIFE - Não, não é o filme de Paolo Virzi na 8 1/2 Festa de Cinema, que começa na semana que vem em São Paulo. Tive ontem minha melhor noite no Cine PE, a última deste ano. Volto à tarde para São Paulo, mas nesses três dias de programação, vivi aqueles momentos cívicos de protesto no palco do Cine São Luiz, assisti a ótimos curtas (e participei de debates intensos). A seleção de longas é sempre mais complicada, mas a curadoria esforçou-se para integrar curtas e longas num discurso coerente, e autoral. A noite de sexta começou com dois curtas pernambucanos. Epígramas, de Wayner Tristao, espécie de homem show - ele fez tudo: direção, roteiro, montagem, edição de som, direção de arte, etc - que passeia pelas ruínas da cidade questionando-se (essas velhas paredes não sustentam tanta mentira), e S/N, de Renata Malta, um homem que tenta voltar para casa, mas no lugar em que acha que ela deveria estar há agora uma farmácia. As transformações da cidade e do humano, o abandono, o perder-se, a identidade. E vieram os curtas nacionais. Tommy Brilho, de Sávio Fernandes, sobre um gay invisível que vira estrela, e nas minhas três noites tenho a impressão de que esse é o favorito do público (com Cor da Pele, sobre o garoto albino); Vivi Lobo e o Quarto Mágico, uma animação delicada, e a diretora Isabelle Santos, assumindo sua dificuldade para falar em público, cativou o público do cinema (teria sido carregada em triunfo); a ficção científica À Margem do Universo, de Tiago Esmeraldo, que me impressionou muitíssimo pelo minimalismo; 3 x Melhor, de Andriolli Araújo, e a questão da negritude, a auto-aceitação, a coragem de ser; Lembra, de Leonardo Martinelli, o mundo da juventude, com suas descobertas, visto da tela de um celular; e O Mistério da Carne, de Rafaela Camelo, em que a humildade do lava-pés cristão desencadeia o processo erótico de duas garotas. Mal tive tempo de respirar - ufa! -, depois de tanta coisa para encher os olhos e fazer pensar, e veio o longa. Espero Tua (Re)Volta, o documentário de Eliza Capai sobre as ocupações de escolas em São Paulo. Ela contextualiza, viaja no tempo (de 2013 a 18, idas e vindas), a voz é a daqueles jovens. Corpos em movimento, em transformação. Corpos que afrontam, enfrentam, são triturados pela máquina da repressão - mas resistem e esperam/propõem a revolta do espectador. Dos que vi, já ganhou. Vou descer para os debates de hoje, almoçar, viajar. Está valendo muito a pena ter vindo. CartaCapital chama José Padilha de 'arrependido'. Se o Cine PE flertou e saiu para dançar com a direita há dois anos, houve um recuo e a cidadania, a militância estão de volta. Nem sei se foram embora. Os curtas, em 2017, propuseram uma discussão bem interessante. Só quem esteve aqui pode saber disso.