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Uma geléia geral a partir do cinema

Cassino Royale (2)

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Já havia entrevistado Martin Campbell pelo segundo Zorro e tinha achado o cara bem inteligente. Campbell é bom de conversar porque é cinéfilo. Sobre Cassino Royale, fiz uma observação que agora me parece óbvia. A cena do assassinato de Issach De Bankole é Hitchcock puro. Sai de Cortina Rasgada, o assassinato de Gromek, no forno da granja. Hitchcock quis mostrar como matar uma pessoa pode ser difícil. Com seu silenciador, 007 abate sem dó, mas o embate físico do herói com Issach é extenuante e Daniel Craig só consegue porque Eva Green entra em cena - como a granjeira que ajudava Paul Newman no filme de Hitchcock. Cortina Rasgada já era a antítese da aventura convencional de espionagem. Aqui, a devastação física de Daniel, todo ensangüentado, é total. Você pode achar que isso é só perfumaria de cinéfilo, mas eu acho que tem algo mais e, dentro da série 007, é inovador como a mudança de ator. Talvez exagere, agora, mas eu, pelo menos, acho que aquilo é mais 'real', ou mais 'intenso', do que a violência de cinema do Scorsese em Os Infiltrados, que me parece brincadeira de menino tentando bancar o bad boy. Mas vamos deixar pra lá - já ando cansado de falar mal de Os Infiltrados, por menos que goste do filme (e da atual fase do Scorsese, na qual Gangues de Nova York e O Aviador conseguem ser piores). A sutileza é que Campbell me disse que tinha mais Hitchcock no filme e ia me cair a ficha. Caiu - justamente a cena do diálogo taco-no-taco de Daniel Craig e Eva Green no trem. Ela repete à psicanálise de Tippi Hedren por Sean Connery, um ex-007, em Marnie, quando ele submete a mulher, sexualmente enferma (e criminosa) a um jogo de palavras liberador. A referência, em si, não faz o filme melhor. Você não precisa dela para entrar em Cassino Royale. Mas eu sei que está lá e que estabelece uma ponte com obras e com um autor que admiro. Isso me dá outra percepção do personagem - e da intenção do diretor.

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