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Uma geléia geral a partir do cinema

Cannes (27)/Ele conseguiu!

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

CANNES - Perdi a hora hoje pela manhã e terminei perdendo o Almodóvar. Passei o dia correndo, mas consegui emendar Kleber Mendonça Filho, Aquarius, com a segunda sessão de imprensa de Julieta. Antes de voltar para o hotel (e postar), passei no Ciro, um simpático restaurante italiano na Rue de Notre Dame. Foi a garçonete quem me chamou. "São brasileiros?", queria saber. "Conoce qualcuno?" Kleber e sua trupe saíam do hotel ao lado, nos carros oficiais, para a gala de Aquarius, que está sendo agora à tarde, enquanto escrevo. Consegui falar rapidinho com Maeve Jinkins. Paraense, brasiliense, pernambucana - Maeve abraça todo o Brasil. Talentosa, linda. Ele conseguiu, o Kleber. O Som ao Redor pode ter-se convertido num dos mais influentes filmes brasileiros recentes, mas Aquarius me pareceu ainda melhor. Mais maduro. É só uma primeira impressão, mas o Brasil inteiro cabe no entorno dessa mulher que resiste. O filme divide-se em três partes - O Cabelo de Clara, O Amor de Clara, O Câncer de Clara. Clara é Sonia Braga, na idade madura. Só quem foi jovem no Brasil, no fim dos ambos 1970 e início dos 80, pode avaliar o efeito que Sonia produzia sobre plateias masculinas. Corajosa Sonia - numa cena, Clara tira a roupa e veem-se as marcas da mastectomia. Como não sabia disso, por um momento fiquei em dúvida, se era de verdade ou algum efeito. Hoje em dia, a reconstrução do seio é feita quase simultaneamente com sua amputação. E se falo no câncer é porque ele é importante no filme. Na ficção de Aquarius, que se passa em 2014 - Clara diz que é viúva há 17 anos e o marido morreu em 1997, lê-se na lápíde -, a especulação imobiliária avança sobre a praia da Boa Viagem. Espigões, espigões, espigões. A incorporadora pressiona para que Clara venda seu imóvel. Ela resiste e, quando está a ponto de ser derrotada, algo acontece. O Brasil das relações sociais em O Som ao Redor, o do dinheiro em Aquarius. Kleber e suas mulheres - não estou falando da produtora, Emilie Lesclaux, mãe de seus filhos (gêmeos), mas nas da ficção. Sonia/Clara,Maeve, Carla Ribas. Acho que vou ter de ver Aquarius umas dez vezes para dar conta de sua riqueza. Como Clara não quer vender o apartamento, era preciso lhe dar uma identidade, para tornar o vínculo convincente. Tudo faz parte da história de Clara, ali dentro. E tem a música, ela própria personagem. Todos aqueles vinis. Viajei em Aquarius. É um filme que toma seu tempo, e o preenche. Torço para que seja ovacionado, o que saberei daqui a pouco.

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