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Uma geléia geral a partir do cinema

Amigos, e o livro do Woody Allen

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Desde que voltei de Berlim, e logo em seguida começou o isolamento social provocado pela pandemia, não havia falado com meu amigo cineasta, Marcus Fernando. Conversamos ontem pelo telefone. Marcus é casado com a Renata, que, além de ser grande profissional, adora cozinhar (e faz comidas deliciosas). Brinquei com ele - quantos quilos já engordou, agora em casa o dia todo? Brincadeira à parte, Marcus me disse que estava lendo - ontem - a autobiografia de Woody Allen, A Propos of Nothing, A Propósito de Nada. Comprou o e-book na Amazon. Aproveitou para rever Setembro. Woody cobre de elogios Bob Hope, uma de suas grandes referências pessoais como humorista, e o Marcus andou pesquisando sobre ele. Comentei tudo isso na manhã de hoje, no meu contato diário com o Bira, Ubiratan Brasil, que edita o C2. (Bob Hope apresentou o Oscar durante muito tempo. Usou tapa-olho na cerimônia de entrega do prêmio em 1969, expressando a expectativa geral de que John Wayne vencesse como o xerife caolho de Bravura Indômita, a versão de Henry Hathaway.) Bira me enviou a crítica do livro publicada no The New York Times, assinada por Dwight Garner. Ele diz que o livro é engraçado, por momentos, mas apresenta tom insensível e banal. Woody destrói Mia Farrow, o que pode ser compreensível por conta do divórcio litigioso entre os dois, mas certas frases que Dwight reproduz são tão grosseiras e vulgares que não parecem dignas do artista, e muito menos apropriadas quando dirigidas à atriz de seus melhores filmes (e aquela que ele transformou em representação da compaixão em Hannah e Suas Irmãs). Dwight escandaliza-se pelos comentários sexistas que Woody faz sempre que o assunto é mulher. Ele não perdoa nem Scarlett Johansson, com quem trabalhou quando ela tinha 9 anos e a quem define como "sexualmente radioativa". Para um cara acusado de pedofilia, não parece muito legal, mas Woody, pelo visto está se lixando. "Tenho 84 anos, minha vida está quase no fim. Na minha idade, estou vivendo com o presente. Não acreditando no futuro, não vejo, realmente, grande diferença prática se serei lembrado como diretor de cinema, como pedófilo, ou de nenhuma maneira." Quem me lê sabe que Woody Allen virou um carma para mim. Não tenho nenhuma admiração pelo fdp que teve um caso com a enteada, o que já aponta para um olhar erotizado dentro das relações familiares. Se não vale para os caras do salário mínimo que querem comer as enteadas (e as próprias filhas) por esse Brasil afora, não pode valer para ele, também. Mas eu não consigo deixar de admirá-lo como artista. Contra tudo e todos, Woody tem feito alguns de seus melhores filmes sem Mia Farrow - Roda Gigante, Um Dia de Chuva em Nova York - e isso eu respeito. Meu impasse continua. Até quando vou conseguir separar o homem do artista? O livro será editado no Brasil, ou vai entrar no índex?

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