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Uma geléia geral a partir do cinema

A origem da Justiça, ou do Mito? Superman, o Glorioso

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

LIMA - Cá estou no aeroporto, em Lima, voltando para o Brasil. Fui a Cuzco e Machu Pichu com meus amigos Dib Carneiro, Gabriel Villela e Claudio Fontana. Na verdade, voltei a esses lugares sagrados/míticos dos incas, aonde já havia estado com a Doris, há mais de 40 anos. Cuzco mudou muito, mas o mistério de Machu Pichu permanece intacto. Falo disso mais tarde, ou de volta a São Paulo. Não queria ver Batman Vs Superman - A Origem da Justiça dublado. Estava me reservando para ver o filme de Zack Snyder esta noite, ou amanhã, porque, afinal, é Páscoa, e quero ver se janto com minha filha, mas não aguentei. Fiz umas pesquisas na rede e era tanta gente a falar mal de Batman Vs. Superman. O filme tem grandes efeitos mas não entrega emoção, Henry Cavill, que faz Superman, é um ator frio, Zack Snyder é o quê, mesmo? Péssimo, grandiloquente... Cada vez me convenço mais de que os filmes, embora sejam experiências coletivas, para se ver no cinema, são, essencialmente, fruições individuais. Cada um vê neles o que quer, ou tem condições de ver. Quero dizer que, se o ano terminasse em 1.º de abril, já teria meus grandes filmes do ano. O Cavalo de Turim, A Vizinhança do Tigre, Cemitério do Esplendor e... Batman Vs. Superman! A Henry Cavill aplica-se o que os semiólogos sempre disseram de Greta Garbo. Se ela era ou não grande atriz é tema de controvérsia, porque Garbo era, acima de tudo, um rosto, uma máscara. Basta lembrar o desfecho de Rainha Cristina, a obra-prima de Rouben Mamoulián. Garbo, na proa do navio, olha o horizonte. Não expressa nada. Nós lemos o que queremos naquela máscara de esfinge. Com Henry Cavill é a mesma coisa. Eu entro em alfa tentando decifrar aquele rosto. Batman Vs. Superman, homens e deuses. Zack Snyder trabalha no registro do mito. Conversei muito, ontem à noite, no jantar, depois de ver o filme, com, Gabriel, grande diretor de teatro. O Superman de Snyder era sobre o pai. Batman Vs. Superman é sobre a mãe. Garoto, o futuro Batman é impotente para evitar a morte da mãe no começo do filme. Mas a cena primeva não está ali para lembrar o que já vimos no Batman de Christopher Nolan. A mãe de Batman, como a de Superman, a mãe terrena, chama-se Martha. No desfecho, no confronto dos dois, Superman clama para que Batman o ajude a salvar Martha. O simples nome evoca camadas profundas no cavaleiro das trevas. Um desses cretinos que li na rede disse que o filme tem efeitos, mas não tem dramaturgia. Só não tem para quem nunca ouviu falar de tragédia grega nem do mito. Só o mito nos explica/redime. Batman, Superman, a situação brasileira, por que não? Batman tem pesadelos terríveis, Superman reencontra, no imaginário, o pai. Henry Cavill devolve a Kevin Costner o olhar que ele lhe deu no fim de Superman, vendo brincar o menino Clark Kent, futuro herói. E Costner fala da mãe, Diane Lane. Fala de Martha. Diane Lane é a chave do filme. Você não deve nada a ninguém, ela diz ao filho. Mas o amor dele por Martha, por Lois, pela Terra, seu mundo de adoção, carrega sempre um posicionamento ético. Não por acaso Clark, como Lois, é um repórter que fuça no lado escuro da cidade, do poder. Tão belo, tão denso, tão triste. Batman Vs. Superman termina numa pompa fúnebre. Nem me passa pela cabeça se Zack Snyder está sendo fiel ou não aos comics. O que me interessa é sua liberdade de criação, seu gênio. Pobre Zack. Grande Zack. Oferece um biscoito fino para as massas. Os críticos (!) não o entendem. Batman Vs Superman tem de ser olhado com a mesma liturgia sagrada de Bela Tárr e seu Cavalo de Turim.

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