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Opinião|Temporadas (1): a Osesp em 2012

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Foto do author João Luiz Sampaio
Atualização:

Há algumas semanas a Osesp lançou sua temporada 2012 e estou desde então devendo um comentário sobre a programação, em torno da qual havia grande expectativa, uma vez que é a primeira feita inteiramente por Artur Nestrovski, novo diretor artístico, assim como marca a estreia de Marin Alsop como regente titular. A novidade é o tema que abarca toda a temporada, Música em Tempos de Guerra e Paz, ainda que ele seja vago demais para significar de fato alguma guinada artística significativa na orientação da programação que, com exceções pontuais, aponta na verdade mais para a continuidade do que para a ruptura. Gostei de ver a Alsop mais envolvida com o repertório brasileiro do que seu antecessor, Yan Pascal Tortelier - vai reger, entre outros autores, Guarnieri, Mignone e Villa-Lobos, o "Momoprecoce", com Nelson Freire como solista. A propósito, sobre Tortelier - nas próximas duas temporadas, será regente de honra da orquestra, e eu me pergunto se sua contribuição artística nos últimos anos, além do episódio dos comentários pouco lisonjeiros feitos sobre a Osesp para a imprensa europeia, lhe dão credenciais para tanto. Afinal, convenhamos, se você parar para lembrar os cinco maiores concertos dos últimos dois anos da Osesp, algum regido por Tortelier estará na sua lista? Na minha não. Mas, enfim, de volta a Alsop, há a sugestão de um comprometimento com a orquestra e o repertório brasileiro, e isso é auspicioso, assim como a programação de um ciclo completo das sinfonias de Bernstein, de quem ela foi aluna. Os ciclos são de fato interessantes - há também as quatro sinfonias de Brahms, cinco sinfonias de Shostakovich e seis concertos para piano de Mozart. Pareceu interessante também a presença de Antonio Meneses como solista residente, fazendo quatro concertos na Sala São Paulo, dois com orquestra, dois de câmara, inclusive com a estreia mundial de um concerto do brasileiro Marcos Padilha. No mais, bons solistas e maestros, mas com algumas ausências sentidas - Vassily Petrenko e Kristian Jarvi (que, aliás, virá ao Brasil pelo Mozarteum) entre elas. O ponto mais polêmico diz respeito aos compositores. A encomenda em parceria com a Filarmônica de Los Angeles e a Sinfônica de Birmingham e a presença de Magnus Lindbergh são bons indícios do prestígio que a orquestra vem ganhando lá fora. Mas chamar Lindberg de "compositor residente" sugere uma colaboração ampla e íntima que não é real. Um residente, afinal, convive com a orquestra, dialoga com seus músicos, escreve obras especialmente para eles. Lindbergh não fará isso, vai apenas realizar um concerto sinfônico e um de câmara. Mais discussão, porém, reside nas encomendas. Parte significativa das estreias que a Osesp fará envolve artistas do universo da música popular, como Toninho Ferragutti, Paulo Bellinatti e Chico Buarque. Não se trata, absolutamente, de diminuir o valor do trabalho desses grandes artistas. Mais do que estética, a questão é, na verdade, de mercado. Evocar a mistura de erudito com o popular na história da música brasileira não fecha a conta - afinal, não é novidade alguma e, além disso, como bem lembrou outro dia o colega Irineu Franco Perpetuo, símbolos dessa corrente, como Radamés Gnatalli, seguem solenemente ignorados pela orquestra. E, no final das contas, o resultado é que a música experimental, de vanguarda, feita por jovens autores brasileiros, fica de fora da temporada da principal orquestra brasileira. Nestrovski afirma que não há "classicômetro" para medir que obras devem ou não ser tocadas por uma sinfônica. Ele tem razão. Mas a ironia, ainda que divertida, desperdiça a chance de um debate sadio. Em tempo: ainda que a Osesp tenha gravado um disco dedicado a Gilberto Mendes, que está feliz da vida com o resultado, por que não programar nenhuma de suas obras sinfônicas ou de câmara ao longo da temporada na qual nosso maior compositor vivo completa 90 anos? Essa homenagem ficou faltando.

Leia aqui a entrevista com Artur Nestrovski sobre a temporada 2012 da Osesp e, aqui, texto de João Marcos Coelho analisando a programação.

Opinião por João Luiz Sampaio

É jornalista e crítico musical, autor de "Ópera à Brasileira", "Antônio Meneses: Arquitetura da Emoção" e "Guiomar Novas do Brasil", entre outros livros; foi editor - assistente dos suplementos "Cultura" e "Sabático" e do "Caderno 2"

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