Foto do(a) blog

Música clássica... E um pouco de tudo

Opinião|O fim possível para o caso OSB

Após oito meses de muito debates e manifestações nem sempre pacíficas, no Brasil e no exterior, chegou ao fim na sexta-feira o Caso OSB. Há uma série de detalhes no acordo firmado entre fundação e sindicato de músicos, que você pode ler aqui, mas em resumo chegou-se ao seguinte formato: 26 dos músicos demitidos formam a partir de agora uma nova orquestra, ainda sem nome, mas pertencente à fundação OSB; 9 artistas, veteranos, têm o direito de escolher em qual orquestra tocar.

PUBLICIDADE

Foto do author João Luiz Sampaio
Atualização:

Há duas questões artísticas prementes, perante as quais o mundo musical brasileiro se coloca a partir de agora, curioso. A primeira: como vai se desenvolver o trabalho da nova Sinfônica Brasileira? A recepção aos concertos já realizados, sob a batuta do maestro Lorin Maazel, parecem sugerir que, se a música soar com qualidade - e todos estarão fiscalizando -, a OSB não deve encontrar resistência para recuperar seu espaço na vida musical carioca e brasileira. A segunda: e o grupo formado pelos demitidos (que deveria ganhar logo um nome), como vai funcionar? Qual será sua orientação artística? Como vai justificar sua existência - e quais as garantias de sua sobrevivência? Nunca é demais lembrar que vimos algo parecido acontecer na criação da nova Osesp, no final dos anos 90, quando um grupo de músicos demitidos criou a Sinfonia Cultura, ligada à Fundação Padre Anchieta. Sob a batuta de Lutero Rodrigues, a orquestra conseguiu, apesar das dificuldades, conquistar um espaço no panorama sinfônico, dedicando-se especialmente a dar espaço a compositores brasileiros. Ainda assim, com uma proposta artística relevante e estabelecida, foi extinta de repente, nem dez anos após a sua criação. Mas, para além da questão artística, há outro aspecto a ser considerado. O clima geral é de celebração. Um dos novos diretores artísticos da OSB, Fernando Bicudo - que ao lado de Pablo Castelar substituiu o maestro Roberto Minczuk no posto - disse que enfim se chegou a uma solução pacífica, exemplo da possibilidade de diálogo. A questão agora é ver qual o lastro concreto desse diálogo. Pois, no fundo, todo o caso OSB nasce da incapacidade de dialogar. E, de certa forma, a questão principal, pivô de toda a crise, não foi resolvida: a dificuldade de relacionamento entre músicos e maestro. Um dos critérios do acordo é que a nova OSB não será jamais regida por Minczuk - e, se algum músico for chamado a tocar na antiga OSB, o fará apenas em concertos não regidos por ele. Em outras palavras, ao menos nesse ponto, institucionalizou-se a birra e a incapacidade de dialogar.

A volta ao trabalho dos músicos é de fato digna de celebração, assim como o retorno normal das atividades do grupo e seu maestro. Oito meses depois, estava mais do que na hora dessa história terminar. Foi o fim possível para o caso OSB. Mas a questão estrutural - o paradigma institucional de entidades culturais e, no caso específico das orquestras, a busca por um modelo inclusivo e democrático de gestão - continua em aberto. Basta lembrar a quantidade enorme de temas que rondaram o caso, que levam a algumas perguntas: Como garantir o nível salarial dos músicos? As orquestras têm estrutura para exigir deles exclusividade - e que estrutura seria essa? Como pode se instituir uma avaliação constante e menos traumática de desempenho? Qual deve ser o papel dos músicos na gestão de uma orquestra? Quais os mecanismos que podem gerir a dinâmica interna de um grupo? Ainda faz sentido a polêmica a respeito da contratação de estrangeiros para uma orquestra brasileira? Qual pode ser o papel de uma sinfônica em uma sociedade, como ela e seus músicos podem se justificar perante a vida cultural? São questões que ambos os lados, assim como tantos outros envolvidos, não souberam responder. Que não seja necessário um novo "Caso OSB" para que isso aconteça.

Opinião por João Luiz Sampaio

É jornalista e crítico musical, autor de "Ópera à Brasileira", "Antônio Meneses: Arquitetura da Emoção" e "Guiomar Novas do Brasil", entre outros livros; foi editor - assistente dos suplementos "Cultura" e "Sabático" e do "Caderno 2"

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.