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Opinião|O fim do caso OSB - e a permanência de um velho problema

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Atualização:

Chegou ao fim o Caso Orquestra Sinfônica Brasileira - 44 dos 79 músicos do grupo já estão em processo de demissão após quase três meses de batalha em torno das avaliações impostas pela Fundação OSB. A orquestra, durante todo esse tempo, insistiu na legalidade das audições programadas para o início de março; e os músicos, por sua vez, defendiam a posição de que as provas são uma medida autoritária e ineficaz no processo de avaliação do trabalho da orquestra. Na justiça, a Fundação OSB conseguiu autorização para levar adiante as provas, consideradas legítimas - instituição privada, a orquestra teria direito de avaliar seus funcionários. Os músicos recorreram a instâncias como o Ministério do Trabalho, que enviou ao Rio, no começo desta semana, um representante que serviria de mediador nas negociações entre as duas partes. A Fundação, no entanto, não reconheceu a mediação do ministério e - com a decisão judicial embaixo do braço - demite agora por justa causa os artistas que se recusaram a obedecer a ordem de fazer as provas. Foi sugerido um Plano de Demissão Voluntária, mas os músicos optaram por não aceitá-lo.

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Se o corporativismo às vezes resvala na teimosia, por outro lado as cartas de advertência e demissão enviadas antes da hora e a busca em audições por substitutos para vagas ainda não abertas também não sugerem a melhor das intenções. Depois da polêmica inicial em torno das provas, a fundação correu para dizer que o objetivo das avaliações jamais foi a demissão em massa. É, no entanto, justamente esse o desfecho da história. Há verdades e exageros para todos os lados. Em horas como essa, a lei parece ser um parâmetro isento ao qual recorrer: órgão privado, a OSB tem direito a demitir seus funcionários. Mas há muitas nuances das quais a lei, em alguns casos, não dá conta. A OSB, afinal, tem dinheiro público, que vem da prefeitura do Rio, à qual correu anos atrás, quando enfrentava o risco de ser fechada por falta de verbas. Além disso, a repercussão internacional, com músicos e especialistas de todo o mundo se pronunciando, é sinal de que não estamos falando apenas da relação empregador/empregado em uma empresa específica. A proliferação de crises, que se repetem ciclicamente em orquestras brasileiras, é suficiente para mostrar que há muito mais em jogo. A lição, se é que podemos chamá-la assim, é que perdemos a chance de mudar o paradigma - ou ao menos sugerir um novo caminho - na relação trabalhista dentro de orquestras. Ainda que uma ou outra exceção exista, o fato é que músicos e direção estão sempre em lados opostos, convivendo no limite do entendimento. Fazem música não em parceria, mas apesar do convívio. O caso OSB tem muito a nos dizer sobre a vida cultural brasileira e, mais especificamente, sobre a atividade sinfônica. É toda uma relação de trabalho - e um contexto institucional precário, prejudicial aos dois lados - que está em jogo. Saímos dessa história sem avançar um milímetro nessa questão.

Músicos estão sem emprego e, como classe, se fragilizaram mais - ainda que a coesão com que lidaram com a questão seja um exemplo raro de união em um meio marcado por individualismos de todos os tipos. Por sua vez, a OSB perdeu a chance de ter criado um sistema mais humano de substituições em seu quadro orquestral. Músicos experientes, que dedicaram uma vida toda à orquestra, poderiam ter recebido tratamento melhor no momento da aposentadoria; com menos truculência, o desejo concreto de desenvolvimento artístico talvez não tivesse parecido a tanta gente uma mera desculpa. Ainda que respaldada pela justiça, é bobagem achar que a Fundação OSB sai vitoriosa da questão. Todos - músicos, maestros, orquestras, público - saímos perdendo.

E é sob esse signo que nasce a nova OSB.

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Texto atualizado às 17h50 de quarta-feira, dia 30/3/11

Opinião por João Luiz Sampaio

É jornalista e crítico musical, autor de "Ópera à Brasileira", "Antônio Meneses: Arquitetura da Emoção" e "Guiomar Novas do Brasil", entre outros livros; foi editor - assistente dos suplementos "Cultura" e "Sabático" e do "Caderno 2"

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