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Música clássica... E um pouco de tudo

Opinião|Força e intensidade

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Foto do author João Luiz Sampaio
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Sou fã confesso da meio-soprano alemã Waltraud Meier desde que a ouvi em um disco do início dos anos 90 com trechos de óperas de Richard Wagner, gravado na Baviera com Lorin Maazel. É uma voz quente (é, como uma vez reclamou a Luana, eu continuo usando recursos extramusicais para definir sonoridades), cheia e, ao mesmo tempo, precisa, cortante. Coisa rara. Sua Isolda, gravada em Berlim em 1991, está entre as grandes interpretações do papel exatamente por conta dessas qualidades, que se combinavam, ali, com a regência marcada de Daniel Barenboim. Bom, ela está agora em nova gravação do "Tristão e Isolda", DVD com a montagem que abriu a temporada 2007/2008 do Scala de Milão. A seu lado, o tenor britâncio Ian Storey e, mais uma vez, Barenboim. A voz já demonstra alguns sinais de desgaste, é verdade, em especial nas zonas mais graves. Mas o domínio que ela tem do papel, em cada gesto, em cada palavra, em cada inflexão... E é esse domínio que lhe permite criar uma Isolda totalmente diferente, mais lírica, de novo em conssonância com a leitura de Barenboim.Curioso que, fora do repertório alemão, Meier já não me agrada tanto. No Don Carlos, de Verdi (cantada em francês), e no Sansão e Dalila, de Saint-Saens, ela me parece um pouco pesada demais, sem a claridade exigida pela escrita dos compositores. Mas, de volta ao repertório alemão, me deparei ontem com um disquinho de 2007 em que Meier interpreta canções de Schubert e Strauss. Algo na linha "The Best of", com as mais célebres criações dos dois - Erlkönig, Morgen, Zueignung, etc. O destaque, no entanto, vai para as Quatro Últimas Canções de Strauss, na versão para piano e voz. Sem todo o aparato orquestral, o ciclo obviamente ganha em intimismo. Mas Meier me decepcionou. Claro que o tema da morte, do fim, recorrentes no ciclo, não é leve. Mas passagens como o crescendo após o solo de violino em "Ao Entardecer" ganham um peso que nada tem a ver com o vôo da alma em direção ao alto - e a si mesma - descrito pelo compositor. É o velho problema da diferença entre força e intensidade.

Opinião por João Luiz Sampaio

É jornalista e crítico musical, autor de "Ópera à Brasileira", "Antônio Meneses: Arquitetura da Emoção" e "Guiomar Novas do Brasil", entre outros livros; foi editor - assistente dos suplementos "Cultura" e "Sabático" e do "Caderno 2"

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