Foto do(a) blog

Divirta-se

Casamento em tempos de coronavírus: lives e videochamadas viram alternativa para noivos

Diante da pandemia, celebrações de casamento online podem ganhar espaço

PUBLICIDADE

Por Júlia Corrêa
Atualização:

O administrador Erik Guerrieri, de 30 anos, e advogada Laíss Casullo, de 32, estavam com praticamente tudo pronto para sua festa de casamento, marcada para o dia 21 de março. Não tinha o que dar errado: depois do registro no cartório, celebrariam com familiares e amigos mais próximos em um restaurante em Brasília.

PUBLICIDADE

Alguns dias antes, no entanto, parentes de Laíss, que viajariam da Paraíba ao Distrito Federal para a festa, começaram a questioná-los a respeito daquele que se tornaria o grande vilão para eles e tantos casais com cerimônias marcadas durante o período: o coronavírus. Envolvidos com os preparativos do casamento e com as demandas da imobiliária que acabaram de abrir juntos, os dois estavam, até então, alheios às dimensões que a pandemia havia alcançado no Brasil.

Ao irem atrás de mais informações, perceberam que não poderiam expor os convidados ao risco de contaminação. "Eu não conseguia parar de chorar; além da frustração, havia o fato de termos abdicado de outros muitos gastos para fazer a festa como queríamos", relata a advogada. Erik ficou responsável por cancelar os serviços com os fornecedores e ela, por avisar o cartório por telefone. Laíss passou horas tentando ligar, mas ninguém atendia. Foi, então, que o casal decidiu ir até o local no dia seguinte.

Era quinta-feira, dia 19, quando se dirigiram ao Cartório Colorado, no Lago Norte, em Brasília. Ao tentarem cancelar a cerimônia, prevista para dois dias depois, foram surpreendidos por uma proposta feita pela funcionária que os atendeu: "Por que vocês não casam agora? Temos horário disponível".

Eles pediram alguns minutos para pensar. Laíss alegou ao noivo que não se imaginava casando naquele estado - de calça jeans e com "cara de choro". Erik, que, segundo Laíss, "sempre busca encontrar o lado positivo das coisas", argumentou que o mais importante era oficializarem a união, mas decidiu verificar com a funcionária se não havia um horário vago no dia seguinte - o último em que o cartório funcionaria, por conta do decreto de quarentena imposto à cidade. "Venham amanhã às 11h20", respondeu, então,a mulher.

Publicidade

Com o pouco de folga que tiveram, eles buscaram fazer daquela situação improvisada um momento especial. "Saímos do cartório às 15 horas da quinta-feira sabendo que íamos casar na manhã seguinte, mas, mesmo assim, decidimos ficar bonitos um para o outro", conta Laíss. Erik lembrou que ele já tinha um terno e ela, um vestido de noiva "pago". Imediatamente, ligaram para a costureira, cujo ateliê fica em Goiânia. Encararam quase três horas de estrada e foram até lá buscar a roupa. Como fora avisada sobre o cancelamento da festa, a costureira não havia finalizado alguns detalhes, mas Laíss levou o vestido do jeito que estava.

Casal oficializou a união no último dia de funcionamento do cartório. Foto: Micah Abe

Empolgados com a situação inusitada, os noivos decidiram gravar toda a aventura pelo celular. "Minha melhor amiga trabalha com vídeos; então, pedi que ela me desse de presente de casamento a edição das cenas que gravamos." Nesse meio-tempo, Laíss se deu conta de que poderia transmitir a cerimônia ao vivo por meio de sua conta do Instagram. O casal também conseguiu garantir que um fotógrafo estivesse presente.

Erik e Laíss chegaram ao grande dia com tudo pronto - ou melhor, com tudo o que era possível, diante de tantas mudanças repentinas. No carro a caminho do cartório, emocionados, colocaram para tocar a música com a qual entrariam na festa. Ao chegar no local, pediram para o fotógrafo ser também sua testemunha. No entanto, era preciso mais uma, e um homem, que chegava ali para registrar a filha recém-nascida, não só aceitou exercer a função como, durante a cerimônia, virou também operador de câmera, filmando tudo pelo celular. Contentes com a disponibilidade do desconhecido, os noivos ainda descobriram que, coincidentemente, ele também era da Paraíba, terra natal de Laíss, e que havia conhecido a sua mulher no mesmo lugar em que eles haviam se encontrado pela primeira vez.

Em uma sala devidamente higienizada do cartório, com álcool em gel à disposição de todos, lá estavam reunidos Erik, Laíss, o fotógrafo, a outra testemunha e o juiz de paz (muito requisitado na cidade por também cantar e ler mensagens personalizadas para os noivos). Porém, de uma forma ou de outra, havia ainda mais pessoas a testemunhar aquele momento: aos familiares e amigos, pôde se juntar, pelo Instagram, um número muito maior de convidados do que o previsto inicialmente.

Delivery foi a solução para o almoço de casamento. Foto: Laíss Casullo

"Eu achei que a transmissão seria apenas para uma lista restrita, mas acabou que a live ficou disponível para todos os meus seguidores; muita gente viu, comentou e compartilhou", conta Laíss, que relata ainda que muitas noivas, passando por situações semelhantes, por causa do coronavírus, foram conversar com ela, tomando seu caso como inspiração. "O mais importante, que era a nossa união, não estava cancelado. Muitas vezes, os noivos acabam nem conversando um com o outro durante as festas; nós percebemos que acabamos resgatando a essência do momento", relata a advogada.

Publicidade

A festa de casamento acabou sendo um almoço com comida entregue em casa, acompanhada pelos bem-casados e pelas bebidas que já estavam comprados e que, agora, vão abastecer a despensa durante o isolamento. Aliás, a celebração caseira acabou contando com um convidado que, até então, não poderia ir à festa de Erik e Laíss: o pitbull do casal, que tem feito companhia (ou "segurado vela") aos dois nesta quarentena - transformada em lua de mel.

PUBLICIDADE

PARA NÃO DEIXAR PASSAR EM BRANCO

Nos Estados Unidos, antes mesmo do avanço do vírus, algumas agências, de nomes como WebWed, já se propunham a realizar casamentos online, garantindo, inclusive, certidões oficiais. E dá para voltar ainda mais no tempo: em épocas de guerra, quando os soldados precisavam ficar longe de suas amadas por tempo indeterminado, os militares criaram um serviço virtual, existente ainda hoje, que ficou conhecido como Proxy Marriages, que possibilita a união a distância por meio de procuração.

No Brasil, enquanto esse tipo de serviço não se populariza, celebrações "simbólicas" podem ser uma alternativa para não deixar passar em branco a data tão sonhada pelos noivos. No caso dos engenheiros químicos Ana Carolina Oliveira, de 25 anos, e Mateus Vasconcelos, de 26, foram amigos e familiares os responsáveis pela festa.

Os dois haviam passado os últimos dias frustrados com o cancelamento de sua cerimônia no Rio de Janeiro, planejada desde outubro de 2018. "Não estava sendo nada fácil; ao mesmo tempo que estávamos tristes com o cancelamento, não tínhamos parado 15 minutos para digerir tudo, pois tínhamos de cancelar todos os serviços", diz ela.

Publicidade

No sábado passado, quando estariam celebrando o tão esperado casamento, Ana e Mateus passaram o dia fazendo faxina em casa - eles estão juntos em quarentena -, tentando não pensar no assunto. Um colega de Ana, que seria um dos padrinhos, a chamou para uma ligação por vídeo, alegando ter de falar sobre trabalho. Ele fingiu que a chamada tinha caído e, então, pediu para Ana abrir um link para acessar novamente a conversa. "Quando cliquei, comecei a ver o rosto de várias pessoas que eu não costumo ver no mesmo ambiente", relembra a engenheira, que, na hora, gritou echamou porMateus, que estava lavando louça.

Sob organização de duas amigas, mais de 40 pessoas participaram do momento, com direito a músicas jáprevistas para anunciar a entrada dos pais e dos padrinhos, que fizeram discursos em homenagem aos noivos. "Foi muito especial. Colocaram até a marcha nupcial para nós dois e, então, agradecemos a surpresa. Eu chorei muito, e o Mateus ficou se segurando", lembra Ana. No fim das contas, a festa-surpresa acabou sendo uma prévia do casamento oficial, que foi remarcado para o fim de setembro.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.