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Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

"No Brasil, negro morto é só estatística", afirma Rennan da Penha

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Por Marcela Paes
Atualização:

RENNAN DA PENHA - Foto: WASHINGTON POSSATO

O nome do primeiro DVD de Rennan da Penha não poderia ser mais sugestivo para o momento do DJ. Segue o Baile sai no dia 12 - com eventos como shows e bailes funks parados pela pandemia. Também remete à boa fase de Rennan que, desde que saiu da prisão no fim do novembro do ano passado, emplaca clipes com milhões de visualizações nas redes.

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Nome conhecido do funk carioca, Rennan recebeu apoio de diversos artistas que consideravam injusta sua segunda prisão pelas acusações de "associação ao tráfico de drogas e de produção de músicas com apologia ao uso" - pelas quais ainda responde processo.

Criado no Complexo da Penha, no Rio, o DJ falou à coluna sobre a pandemia nas comunidades, o futuro dos bailes, sua prisão e sobre as mortes do garoto João Pedro, em São Gonçalo, e do americano George Floyd, nos Estados Unidos.

Você organiza bailes funk há bastante tempo. Como imagina que será a volta depois da pandemia? Acho que os bailes fora das comunidades, em lugares mais centralizados, voltam antes. No Baile da Gaiola iam de 7 a dez mil pessoas. Com um artista mais conhecido, chegava até a 20 mil pessoas. Ninguém vai ter coragem, vai ser realmente bastante difícil.

Você acha possível fazer um baile com isolamento social? Acho que é impossível porque, cara, é baile, é funk...É um ritmo sensual, é um ritmo que todo mundo quer dançar perto, entendeu?

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Muitos artistas estão fazendo lives. Você acha que a pandemia vai mudar alguma coisa na indústria da música permanentemente? As lives são boas por um lado e ruins pelo outro. Tem muita gente envolvida na indústria da música que não está ganhando nada com isso, como donos de casas de shows, pessoas que trabalham nos bares, técnicos. Também para os artistas não é a mesma coisa. Não tem calor humano, Live é uma parada que não é normal pro artista.

Como avalia a situação da pandemia nas comunidades? Eu ainda tenho família lá. Está diferente, não tem mais o fluxo que costumava ter, está todo mundo de máscara, mas muita gente ainda tem que continuar saindo pra trabalhar, fazer suas coisas. Pô, eu acho que esse isolamento social não é pra todo mundo, entendeu? Não tem como as pessoas deixarem de ter contato com outras porque às vezes elas não têm opção, realmente precisam.

Pode dizer que tirou algo positivo de suas passagens pela prisão? Fiquei feliz pelas pessoas que me apoiaram e eu nem sabia que me conheciam. Até queria aproveitar e agradecer a Leandra Leal, a Paula Lavigne, o Emicida. O posicionamento desses artistas me ajudou muito. Nos sete meses que eu fiquei lá também soube dar valor ao meu trabalho, minha família.

Como foi ver o reconhecimento do seu trabalho? Eu vivi na favela, eu não esperava que o meu trabalho pudesse se expandir tanto, porque até um tempo o DJ não era tão valorizado como é hoje. Pô, eu fiquei sabendo que eu ganhei um prêmio no Multishow dentro da cadeia.

O assassinato de uma homem negro pela polícia gerou uma onda de protestos. Por que não há o mesmo tipo de reação no Brasil? É triste porque eu cresci vendo isso. Assistindo a tiroteios... Já vi bala acertar minha escola. Acontecia o tiroteio e eu achava normal. O nosso País não muda. Várias pessoas sofrem com isso diariamente e não acontece nada? Aqui, um negro morto pela polícia é só estatística. Aconteceu com o João Pedro, aconteceu com a menina Agatha. Uma criança não substitui a outra, entendeu? As pessoas estão deixando de lado o que realmente tá acontecendo nas comunidades. No caso dos Estados Unidos, eu prefiro nem ficar vendo porque me faz muito mal. A vida de um negro é tão insignificante a ponto do cara dizer que não estava respirando e o policial continuar colocando todo peso no pescoço dele?/MARCELA PAES

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