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Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

Impulsionado por pandemia Kobra cria instituto para crianças e adolescentes de comunidades

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Por Marcela Paes
Atualização:

Eduardo Kobra. Foto: Alan Teixeira

Um sonho antigo do artista plástico Eduardo Kobra ganhou impulso durante a pandemia: um instituto para ajudar artistas de comunidades pobres e conectar crianças e adolescentes à arte. Um dos mais conhecidos grafiteiros brasileiros - com murais em diversos lugares do mundo - Kobra só foi entrar pela primeira vez em uma galeria de arte perto dos 30 anos. "É uma coisa que faz parte da  minha origem. O instituto  vem dessa preocupação com as populações mais vulneráveis, marginalizadas", explica. Na maior parte do tempo isolado no interior, o artista também ressignifica por meio do trabalho a morte de sua filha, Catarina, que faleceu 10 horas após o parto. "Fiz um mural intitulado A Mão de Deus, onde eu falo um pouco sobre isso, sobre fé". Leia abaixo a entrevista.

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O que te impulsionou a fazer o instituto?

Em 2019 fizemos o projeto Galeria Itinerante, onde eu adaptei um ônibus que percorreu 12 bairros da região metropolitana de SP, principalmente comunidades mais carentes. Aí pude ter uma interação muito grande com crianças e adolescentes das comunidades pobres e realmente perceber o tamanho da cultura e a quantidade de artistas que existem nesses lugares e precisam de um incentivo. Quis dar um retorno, muito de coração aberto, para os bairros como o que eu nasci, prioritariamente comunidades periféricas.

Já pensava em fazer algo do tipo antes?

É uma coisa que faz parte da minha da minha origem, faz parte da minha trajetória. Sempre me preocupei em passar mensagens de pacifismo, da importância de preservação ambiental, defesa das liberdades, combate ao racismo. O instituto faz parte disso, dessa preocupação com as populações mais vulneráveis, em especial vidas de crianças e adolescentes marginalizados. Levar essas manifestações artísticas para todos aqueles que costumam ter menos acesso a museus, a centros culturais.

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Você também sofreu esse tipo de dificuldade de acesso à manifestações culturais?

Eu entrei numa galeria de arte pela primeira vez com quase 30 anos. Então, eu acredito que esse instituto possa diminuir essa distância, sabe? E também valorizar a riquíssima cultura que o Brasil já tem nessas comunidades periféricas. 

Como a pandemia afetou seu trabalho? 

A pandemia me fez ter uma reflexão, um amadurecimento mesmo da minha arte, da minha carreira. Eu tinha mais de 40 convites internacionais de 2019 pra cá, incluindo algumas obras super importantes. Um painel na fachada do World Trade Center, em Nova York, no local onde eles vão construir a segunda torre. Mas, claro, isso foi adiado. Pelo menos outros seis ou sete painéis nos Estados Unidos, murais nos Emirados Árabes. Estava muito entusiasmado com todas essas possibilidades, mas esse movimento de readaptação me fez repensar  o meu trabalho como uma ferramenta de transformação social. Refleti e foi aí que comecei efetivamente a impulsionar o meu instituto.

O que você vem fazendo durante esse período de isolamento?

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Mantenho o ateliê na Vila Madalena. É o lugar onde eu acabo criando algumas das obras porque todos os meus trabalhos têm um original. Também tenho passado tempo no interior, com a minha família. Eu faço parte do grupo de risco, tenho um problema de intoxicação de metais pesados e alguns problemas respiratórios, então estou tomando um cuidado redobrado.

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Como foi lidar com a morte da Catarina?

A Catarina foi muito esperada. Nós preparamos o quarto, estávamos ansiosos pela chegada dela, a irmãzinha do Pedro. Acho que de qualquer forma eu vivi um milagre, até mesmo pela saúde da Andressa, minha mulher, porque ela correu muitos riscos de vida. A Catarina viveu por 10 horas e marcou para sempre as nossas vidas. Recebi orações de tantas pessoas, isso nos deu força. Eu fiz um mural na entrada do Minhocão intitulado A Mão de Deus, onde eu falo um pouco sobre isso, sobre a fé. Deus tem nos resgatado desse local e temos ganhado mais esperança. Aos poucos vamos retomando a nossa vida. Mas, sem dúvida, afetou bastante o meu trabalho, o meu processo de criação como um todo.

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