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'DNAs virais são esqueletos da evolução', explica Lygia da Veiga Pereira

Por Sonia Racy
Atualização:

Lygia da Veiga Pereira. Foto: Editora Trip

Chamou atenção, na segunda-feira, estudo da Fiocruz, sobre o SARS-CoV-2 - foco de reportagem do Estadão - informando que ele é capaz de reativar vírus ancestral presente há ... cinco milhões de anos na linhagem evolutiva dos seres humano. A multiplicação do retrovírus primitivo (HERV-K) está associada a casos mais graves de covid-19 bem como à mortalidade precoce pela doença, segundo o trabalho.

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Pois bem: indagada a respeito, a cientista Lygia da Veiga Pereira, da USP, professora e renomada geneticista - ela criou as primeiras células-tronco embrionárias no País e lidera o Projeto DNA do Brasil que está sequenciando o genoma dos brasileiros - explicou que o nosso genoma é cheio de elementos cuja função ainda não é bem conhecida. Durante anos, "o DNA que não virava proteína humana" era chamado de "DNA Lixo".

Hoje, sabe-se que há muitas coisas nesse genoma que funcionam. Entre elas, os esqueletos de DNAs virais, que há muitos "milhões e milhões de anos", infectaram alguns "de nossos ancestrais e foram incorporados ao nosso DNA". Não se sabe muito sobre suas funções, atividades, "mas eles estão lá, cicatrizes, esqueletos da evolução".

Segundo Lygia, também em outras doença que não a covid-19, alguns genes desses vírus ancestrais também estão ativados e começam a produzir proteínas. Isso já foi visto em tipos de câncer, em HIV. "Quando um paciente com HIV toma os retrovirais e o sistema imunológico dele volta a funcionar, já foi visto que alguns genes desses esqueletos de DNA viral que estão no nosso genoma são ativados."

Resta saber agora se isso é causa ou consequência. A cientista explica que em toda correlação entre dois eventos, é preciso entender "se isso é uma coisa causal". Ela acha que a descoberta é importante, porque "pode indicar que esses elementos na parte escura do nosso DNA têm funções importantes para nossa saúde que ainda desconhecemos".

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Mas atenção, isso não significa que nossas células começam a produzir esses retrovírus e aí eles passam a sair infectando mais coisas. "O coronavírus ativa alguns genes desses retrovírus que entraram no nosso genoma quando éramos chimpanzés, e essa ativação está associada a uma maior resposta imunológica. Um dos problemas da covid é a resposta exagerada do nosso sistema imunológico, e essa resposta exagerada acaba fazendo mais mal... fazendo muito mal". O trabalho da Fiocruz, segundo a geneticista, reforça o fato de quanto se tem ainda para aprender, escondido no DNA humano e que essas descobertas vão "nos ensinar como é que a gente funciona".

Lembra ainda que o projeto DNA do Brasil está há quase cinco meses parado aguardando o decreto da Lei Orçamentária Anual - LOA - assinado por Bolsonaro anteontem.

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