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Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

'Aquela noite está até hoje em minha memória'

Por Sonia Racy
Atualização:

FOTO WILTON JUNIOR/REPRODUCAO 

Pela segunda vez, em um 13 de março, José Serra vai amanhã a um evento político marcante da vida brasileira. O primeiro foi há exatos 52 anos e ele, então presidente da UNE, discursou no célebre Comício das Reformas de João Goulart, no Rio de Janeiro. Corria 1964, o Brasil era um país dividido e o comício, num enorme palanque montado diante da Central do Brasil, desencadeou a radicalização política. Não era de impeachment que se falava, mas de golpe. Dezoito dias depois, Jango era deposto pelos militares. O País mergulhava em uma ditadura que haveria de durar 21 anos.

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Maria Thereza Goulart (na foto acima, com o presidente), que naquela noite quente de sexta-feira estava no palanque ao lado do marido e de Serra, não vê motivo para repetir hoje o programa. "Acho lamentável que nesta mesma data, cinco décadas depois, tenhamos de ver de novo a direita avançando", resume a ex-primeira-dama, hoje com 75 anos, definindo seu lado. "Aquela noite está até hoje em minha memória", diz ela. Festejada na época, pela beleza e elegância, Maria Thereza diz guardar daqueles dias lembranças amargas.

"Hoje acho tudo aquilo muito triste. O discurso de Jango e a convicção com que defendia as reformas ficaram gravados em mim para sempre". Ao que seu filho João Vicente, ex-deputado do PDT - na época, um menino de sete anos - acrescenta: "Veja só, o Serra trocou de lado. Na UNE, atuava com a esquerda e os sindicatos..." A seu modo, o senador tucano estabelece as diferenças. "O 13 de março de 1964 é o simétrico do recíproco do 13 de março de 2016."

O de 1964, diz Serra, "foi promovido pelo Jango e pela Confederação Geral dos Trabalhadores. No fundo, era um comício contra um golpe que se avizinhava e de fortalecimento do próprio Jango. E o atual é uma mobilização de protesto contra o governo". E conclui recorrendo a uma fórmula estritamente matemática: "Nesse sentido é que a gente pode dizer que um é simétrico do outro. Ou seja, um é "x" e o outro é menos um sobre "x".

Entre os que estavam no palanque de Jango e podem, 52 anos depois, comparar os dois episódios, havia ainda figuras como Almino Afonso, Clodesmidt Riani e Raphael Martinelli - todos da esquerda sindical e que, como Maria Thereza, não vão a manifestação nenhuma hoje. Martinelli, um fiel quadro do então poderoso Partidão, acaba de ser presenteado com uma biografia - Estações Ferroviárias, lançada no final do ano passado. Riani, articulador sindical, recebeu recente homenagem na Comissão Nacional da Verdade.

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Almino Afonso, que havia sido ministro do Trabalho de Jango, estava lá mas não chegou a participar do palanque. "Nem fiquei no comício, pois a multidão era enorme e eu decidi voltar pro hotel, ali no centro do Rio. Vi pela televisão. O impressionante é que, passado todo esse tempo, alguns dos programas de Jango, como a reforma agrária, estão por fazer."

Ele vê, entre os dois momentos, uma semelhança. "A de hoje tem algo em comum com a de 1964. As duas acontecem em momentos dramáticos da vida brasileira". / GABRIEL MANZANO

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