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Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

'Acompanhar mudanças culturais é um dever da família real', diz dom João

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Por Sonia Racy
Atualização:

JOÃO HENRIQUE DE ORLÉANS E BRAGANÇA. Foto: ARQUIVO PESSOAL

Defensor do Estado laico e do suprapartidarismo, João Henrique de Orléans e Bragança se indignou ao ler domingo, no Estado, sobre o apoio que um de seus primos, dom Bertrand, tem dado à pauta conservadora de Jair Bolsonaro. Para dom Joãozinho - como é conhecido o trineto de Pedro II - é um dever da família real acompanhar as mudanças sociais e culturais do Brasil.

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"Bertrand não representa a família e nem os valores que temos desde Dom Pedro I", afirma. A seguir, trechos da conversa com a coluna.

Como vê o que está acontecendo no Brasil? As populações das democracias estão decepcionadas com a política em geral. Com as redes sociais, cresceu a força de quem não quer depender de partido. Por um lado, isso é positivo porque mais pessoas estão se manifestando. Mas, com a descrença nos políticos, uma série de pessoas que não têm nada a ver com a política chegou ao poder. O Donald Trump nos EUA, o Emmanuel Macron na França, a direita radical na Polônia e na Hungria. Recep Erdogan (Turquia). E, no Brasil, o Bolsonaro.

E o que acha desse processo? Grande parte do mundo está se voltando à direita, mas é uma direita radical, não tolerante. Da mesma forma que existem os fundamentalistas do PT, há também os radicais fanáticos da direita bolsonarista. Ambos são perigosos para a democracia, para o diálogo.

As instituições do País são fortes para segurar o fenômeno? Sim, são fortes. Mas, na hora em que temos manifestações públicas que criticam o STF, também não é saudável para a democracia. Algo de errado está acontecendo. O próprio protagonismo do Supremo vem de uma das lacunas da Constituição de 1988, que permite que a corte aprecie muitas pautas que não deveriam estar sendo julgadas lá.

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Há risco para a democracia? Hoje em dia, há ditaduras em que se acabou com a democracia por meio da própria democracia. Na Hungria e na Polônia, a corte suprema foi ampliada, nomeando-se ministros fiéis a quem governa. Na Venezuela, o Chaves nomeou sete ministros fiéis a ele. Não se faz mais ditaduras com golpes, se faz comendo as liberdades pelas bordas. Antonio Gramsci dizia isso no começo do século passado, é assim que se toma o poder. Não temo pela democracia no Brasil porque temos instituições fortes e uma opinião pública democrática.

O sr. diverge dos seus familiares no que diz respeito à política nacional, não? O Bertrand se filiou - há décadas atrás - ao grupo Tradição, Família e Propriedade, uma vertente fundamentalista da religião católica que é condenada pela Igreja. Ele não representa a família e nem os valores que temos desde Dom Pedro I, Dom Pedro II e Princesa Isabel.

Quais são esses valores? Valores de diálogo, respeito ao debate de ideias opostas, tolerância, liberdade opinião, liberdade religiosa e suprapartidarismo. Dom Pedro II era respeitado por liberais e conservadores porque nunca tomou partido, sempre lutou pelo cumprimento da constituição. Foi um dos períodos de grande estabilidade institucional no Brasil. É um dever histórico da família real servir ao País e acompanhar as mudanças culturais e sociais. O Estado moderno tem que ser laico e o respeito a todas as religiões deve ser seguido. A conversão de populações indígenas a qualquer religião é um crime. Foi assim que os colonizadores dominaram as populações latinas.

Nas monarquias modernas, o chefe de Estado não tem partido e ideologia? Nem pode ter. Não só nas monarquias, nos parlamentarismos também. Há clara divisão entre Estado e governo. O governo SIM, pode ser de esquerda, centro ou direita.

Qual sua avaliação do atual governo? Torço pelas reformas necessárias que todos os governos, de variados partidos, tentaram e não fizeram. Reformas econômicas, diminuindo os gastos inúteis de um Estado inchado. Ministérios como o do Meio Ambiente, Educação, Relações Exteriores e Direitos Humanos me parecem, frequentemente, medievais. É uma pena que o governo esteja gastando capital político na liberação de armas e na discussão sobre assento para bebês. /PAULA REVERBEL

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