Vá ao Rock in Rio, mas pense bem antes de convidar alguém

Marcelo Moreira

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Por Redação
Atualização:

Vá ao Rock in Rio 2011, mas não me convide. A máxima aplicada aos chatos que costumam aborrecer pedestres nas grandes cidades com campanhas de incentivo ao teatro está sendo aplicada ao grande festival do Rio de Janeiro, que acontece a partir do final do mês, em alguns círculos musicais paulistas.

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Descontando a má vontade evidente por conta do gigantismo do evento e também a mais do que evidente inveja, o fato é que o Rock in Rio 2011 hoje não passa de uma marca - poderosa, é verdade -, mas apenas uma marca. Qual o seu significado para 2011, após 26 anos da primeira edição e depois de perambular por locais com Lisboa e Madri?

Para quem gosta de rock puro, a resposta fica cada vez mais difícil - e irrelevante. O novo conceito do festival, já testado e aprovado na Europa, expande as fronteiras artísticas: é uma grande feira de entretenimento, onde a música e os shows ao vivo passam a ser apenas mais uma das atrações. E isso é algo cada vez mais difícil de engolir para parcela expressiva do público brasileiro mais ligado à música.

A diretora-geral do evento, Roberta Medina, é uma entusiasta deste modelo e nunca escondeu que, como modelo de negócio, somente desta forma o Rock in Rio é viável - ainda mais no Brasil: uma ampla mistura de ritmos, cores, tribos e os mais variados tipos de entretenimento, com muitos palcos e mais de uma centena de atrações artísticas.

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 Foto: Estadão

O conceito não é novo no Brasil. Já foi aplicado anteriormente, em maior ou menor escala, nos festivais Planeta Terra, SWU e Atlântida. O Rock in Rio 2011 levou ao extremo o conceito, que não deixa de ser interessante, principalmente para quem consome entretenimento, e não apenas shows e música.

O difícil é saber se o tal conceito vai pegar em edições futuras, não levando em consideração aqueles que, em tese, foram o suporte dos principais festivais brasileiros que vieram na cola do próprio Rock in Rio I, de 1985: os fãs de música e, em particular, de rock em geral.

Se hoje já não existe mais o apelo do artista inédito ao vivo no Brasil - quase todo mundo que importa e que conta no rock e na música pop já pisou no Brasil nos últimos 26 anos -, ainda existe a celebração e o culto à boa música e à excelência das apresentações ao vivo.

O novo formato privilegia a diversidade hoje tão característica em festivais como Glastonbury (Inglaterra), Reading (Inglaterra), Roskilde (Dinamarca) e Graspop (Bélgica), onde heavy metal, pop, hip hop, reggae, world music e outros ritmos convivem sem dificuldades. Foi assim nas edições do Rock in Rio de Madri e Lisboa.

Transplantado para o Rio de Janeiro, o modelo mistura o peso e a força de Metallica e Motorhead com a história densa do soul/pop/funk/rock/blues do mito Stevie Wonder (até aí nada contra) e com as ladainhas e falta de qualidade do que hoje se chama rhythm and blues -coisas dispensáveis e descoladas como Rihanna.

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Há ainda coisas mais dispensáveis ainda, como Kate Perry, Shakira, Cláudia Leitte, Ivete Sangalo e a chamada "Pista Eletrônica", setor totalmente incompatível com um festival que tem rock no nome.

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Ou seja, quem pretende assistir alguma coisa de qualidade terá de suportar coisas indignas de figurarem em um festival da grandiosidade e da importância do Rcok in Rio. Restará apenas tentar pinçar algo interessante no palco Sunset, cuja programação será marcada por encontros inusitados - Ed Motta receberá o português Rui Veloso e o guitarrista Andreas Kisser, do Sepultura (???); Bebel Gilberto cantará com Sandra de Sá (?????); Marcelo Jeneci e Curumim (???); Marcelo Yuka tocará com Cibelle, Karina Buhr e Amora Pêra (?????????); Cidade Negra (aaargh) receberá Martinho da Vila e Emicida (??????????????????); Erasmo Carlos e Arnaldo Antunes; Zeca Baleiro (????????); Mutantes tocando com Tom Zé (fuja do planeta!); Marcelo Camelo e The Growlers (fuja da galáxia!)...

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Esqueça todas essas bizarrices. Vá no certo neste Sunset Stage: Milton Nascimento com a jazzista Esperanza Spaulding; Matanza e B Negão (vale pelo Matanza); Korzus tocando com os Punk Metal Allstars; Angra tocando com a cantora finlandesa Tarja Turunen (ex-Nightwish); Sepultura recebendo o Tambours du Bronx; Titãs no mesmo palco que a veteraníssima banda punk portuguesa Xutos & Pontapés; Afrika Bambaata cantando com Paula Lima (vale pela curiosidade).

O rock sai perdendo de goleada no Rock in Rio 4 com seu novo conceito de diversidade e entretenimento. Ganham a pluralidade e a orientação quase que exclusivamente pop. A música lentamente deixa de ser o foco principal. Que assim seja. Mas não me convide, por favor...

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