Estadão
06 de dezembro de 2011 | 06h26
Jotabê Medeiros
Raras vozes comparam-se à do cantor britânico Jon Anderson, cujos vocais estiveram durante 35 anos a serviço da banda de rock progressivo Yes (e numa célebre parceria com o grego Vangelis). Tão rara e tão delicada que, quando foi detectada com problemas médicos, a voz foi condenada pelos ex-colegas do Yes, que o demitiram.
Mas, seis cirurgias depois e um ano de tratamento, Jon Roy Anderson voltou com seu instrumento de trabalho intacto (há quem ache que ele cante em falsetto, mas seu registro é natural, um pouco acima do de tenor). Há 5 anos, Anderson iniciou um disco colaborativo, Survival & Other Stories, e voltou a correr o mundo sozinho. Volta no dia 13 a São Paulo para show de natureza acústica no Citibank Hall, uma espécie de recital progressivo. “Somos apenas eu e meu violão”, anunciou, em entrevista ao Estado.
O sr. lembra da sua última vez no Brasil?
Sempre que vou ao Brasil, é maravilhoso, é uma excitação. Há grande música no Brasil e em São Paulo.
O sr. tem um novo disco. Quantas músicas dele vai tocar aqui?
Eu toco duas canções. E é claro que toco músicas dos anos 1970, 1980, 1990. É uma longa história, sabe?
O sr. fez esse álbum como um projeto meio socialista, em colaboração com seus fãs. O sr. acredita que essa pode ser uma experiência contínua?
Sim. Há muitas pessoas talentosas no mundo, e a internet ajuda a aproximá-las. Então, é como uma corrente infinita de energia musical, é maravilhoso.
Seria como uma ponte? Quero dizer, um homem como o sr., com tanta experiência na música… Como faz para funcionar com gente que não tem experiência alguma?
Bem, eu só peço a eles que me mandem música. Então, eu ouço a música deles e, se gosto, se é excitante para mim, eu canto sobre essa música e envio para eles de volta, e eles me mandam de novo, até que fique pronto. Hoje, estou em contato com Alessandro, da Itália. Ele compôs uma sinfonia moderna, e gostaria que eu cantasse nela. Eu disse: OK, mas espere eu terminar minha turnê, acabo em janeiro. Há tantas ideias. Eu me sinto saudável, feliz, bem disposto. E estou louco para chegar aí e cantar no Brasil, em Florianópolis, São Paulo, Porto Alegre.
É como se fosse uma jam session das antigas, como os jazzistas faziam.
Sim, sim. Veja você que eu estava na Inglaterra, três anos atrás, numa cidadezinha chamada Southend, e ouvi um cara tocando uma canção do Jimi Hendrix na rua. Ele tocava como Jimi Hendrix. Tinha 19 anos. Eu perguntei: De onde você é? Ele disse: “São Paulo, Brasil”. Eu disse: Aqui está meu e-mail, por favor me mande alguma música sua. Ele mandou, e nós fizemos música juntos. É assim que a gente conhece as pessoas. Você nunca sabe onde e como vai conhecê-las. A música que tocamos não está no disco, é para o futuro. Eu ainda não tenho canções suficientes para o novo disco. Quando as tiver, farei algo. Não faço música para ganhar música, mas para a criação.
Lembra o nome do garoto?
Ah, Gosh! Não estou lembrando. Sei que o pai dele é advogado, e o pai dele não gosta que ele faça música.
O sr. esteve no Yes durante 35 anos. E eles acabam de lançar um novo disco, Fly from Here, com Chris Squire, Steve Howe, Alan White, Geoff Downes e o novo cantor Benoit David. O sr. ouviu o disco? O que achou?
Só ouvi uma canção. É OK. Se você quer saber quais são meus pensamentos musicais nesse momento, vá até o computador e faça o download de minha nova música, Open, no Itunes. Eu lancei três semanas atrás, quando festejei meu aniversário de 67 anos. Se você ouvir Open – não é caro, 20 minutos de música –, essa vai dar a você uma ideia do meu pensamento musical hoje.
É muito diferente do seu tempo musical no Yes?
Não. É muito parecido com o Yes, porque eu sempre estive na banda como cantor, compositor e diretor musical. É a música do Yes que ainda permanece na minha cabeça.
O sr. trabalhou com Milton Nascimento no passado. Ainda mantém contato com ele?
Meu cantor favorito, Milton. É o homem perfeito cantando. Eu o vi da última vez quatro ou cinco anos atrás. Sempre procurarei vê-lo. Acho que a voz dele é uma bênção. Todas as vozes são uma bênção de Deus. Há tantos cantores fantásticos no mundo, e eu me sinto privilegiado por minha voz ainda ter potência e eu ainda ter grande prazer em cantar para o público.
Foi justamente quando sua voz falhou que seus colegas do Yes o deixaram para trás e seguiram sem o sr. O que os médicos disseram de sua saúde naquele momento?
Eu tinha um ouvido muito doente. Todo mundo fica doente em algum ponto da vida. Eu tive de parar por 5 meses para fazer uma operação no estômago, um bloqueio no pâncreas. Operei também minha garganta seis vezes. Fiz o que tinha de fazer e levou seis meses para eu poder cantar de novo. Não começou da mesma forma que antes, mas foi ficando mais forte, e mais forte ao longo dos meses. É normal. O grupo decidiu que iria prosseguir sem mim, e eu fiquei muito decepcionado. Mas logo superei isso e disse: bom, vou começar uma carreira solo e fazer música da melhor forma que puder.
O sr. diria que sua voz está 100% agora?
1.000% (risos). Você vai ouvir Open e vai poder me dizer pessoalmente.
O sr. sabe que o rock progressivo, nos anos 60 e 70, foi uma força massiva no rock’n’roll. Muitas pessoas acreditam que o punk rock veio como uma oposição ao prog-rock.
É claro. E também porque era um bom negócio. As companhias de discos não se importam com o que os músicos fazem, importam-se se isso vai lhes trazer dinheiro. Muita gente jovem fazendo uma revolução, e ainda assim podia trazer dinheiro… Eu adoro revoluções: emocionais, musicais, sentimentais. Em um ritmo progressivo, tudo é bom.
O sr. ainda acredita no rock progressivo?
É tudo música progressiva. As bandas mais recentes, como o Radiohead, que tentam fazer algo diferente, são aventurosas e portanto progressivas. Música é como uma aventura, minha progressão ainda não terminou.
JON ANDERSON
Citibank Hall. Avenida Jamaris, 213, Moema. Informações: 4003-6464. Dia 13/12, às 21 h. R$ 210/ R$ 310.
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