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Acima do ódio e da guerra, corre rock nas veias do Ira!

Jotabê Medeiros - O Estado de S. Paulo

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Por Redação
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Imagine que John e Paul concordaram em fazer um show 6 anos após a separação dos Beatles. Guardadas as devidas proporções, é o que vai acontecer na noite desta quarta em São Paulo: o guitarrista Edgard Scandurra e o vocalista Nasi vão se juntar no palco após terem implodido rancorosamente a banda Ira! (uma das fundamentais dos anos 1980 no rock nacional), para um show beneficente na Vila Olímpia. O local já está mais do que lotado.

 Foto: Estadão

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Sangue quente, tietagem, drogas, dinheiro, mulheres: o coquetel que resultou na implosão é conhecido. "Teve muita Yoko no meio. Muita droga, muita briga. Mas eu prefiro colocar a responsabilidade (pela separação) na gente mesmo", disse ontem Marcos Valadão Rodolfo, o Nasi, vocalista do Ira!. A banda do show de armistício contará ainda com o filho de Edgard, Daniel Scandurra (baixo) e Felipe Mello (bateria), ambos do projeto solo de Scandurra, o grupo Amigos Invisíveis. Fizeram um único ensaio, anteontem.

Dissolvido em 2007 após 26 anos de estrada, o Ira! levantou uma bandeira branca quando ninguém mais botava fé. Scandurra nunca falou muito sobre o racha, mas Nasi era sempre implacável. "O Ira! sou eu, está vivo dentro de mim. Com algumas pessoas de lá não divido nem a mesa. Espero que sigam suas vidas, mas ninguém mais mama na minha teta", afirmara o cantor, em 2010.

Nasi fará 52 anos em 23 de janeiro. Scandurra completará 52 anos no dia 5 de fevereiro. Têm muitos projetos solos. Mas seu reencontro é histórico, e será testemunhado hoje por apenas 600 pessoas no Traffô Espaço de Eventos, às 19h (a renda será revertida aos alunos bolsistas da Escola Nane, que atende crianças e jovens com dificuldade de aprendizagem).

A trégua surpreendeu geral. Seis meses após lançar sua autobiografia, A Ira de Nasi, em 2012, o cantor resolveu ligar para o guitarrista. "Demorei. Mas, mesmo apreensivo, resolvi ligar. Fui bem-recebido, e havia o projeto de auxiliar os bolsistas. Isso foi bom porque a gente não se encontrou para conversar sobre uma volta da banda, mas por uma circunstância externa".

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Foram anos de duros rancores para os mods. O atrito acabou contribuindo também para um drama familiar: o pai de Nasi pediu sua interdição judicial e seu irmão, Airton, que era empresário da banda, foi agredido pelo cantor - ele foi condenado a indenizar Airton em R$ 100 mil. Já fizeram as pazes.

"O rock tem essa característica. Os frontmen têm eletricidade. O desgaste aumentou com as críticas mútuas, o que fez com que nós dois duelássemos como Hatfield e McCoy (série de TV)", brincou Nasi. Falando seriamente, ele avalia que o Ira! já era para ter acabado na década de 90. "Edgard também achava que deveríamos ter dado um tempo, para reciclar. Houve uma crise da nossa liderança. Teve um momento em que todo mundo liderava. É como diz o ditado: cachorro que tem muito dono morre de fome."

Mas o Ira! não acabou e ainda teve uma "sobrevida bacana": lançou um bom disco, É o Amor, e ganhou dois prêmios da APCA. "Eu me arrependo da maneira que acabamos, com o furacão envolvendo famílias, empresários. Mas tinha de ter acabado mesmo", diz Nasi, que acha que a reunião de hoje pode "abrir portas" (tradução: o Ira! pode fazer uma turnê em breve). "Meses atrás isso seria impensável. Mas foi dado um passo importante, a recuperação de uma amizade após daquela briga tão feia, tão triste", disse Scandurra.

O repertório é baseado nos dois primeiros discos da banda, Mudança de Comportamento (1985) e Vivendo e Não Aprendendo (1986). Scandurra compôs ali um clássico sobre a cidade, Pobre Paulista. Tinha apenas 16 anos, e seu desabafo adolescente, cru, punk, é o tipo de sentimento que o Ira! deflagra.

NASI E EDGARD SCANDURRA Espaço Traffô. Rua Gomes de Carvalho, 560, tel. 3045-4524. Hoje, 19 h. R$ 150/ 210.

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